A fila vai ser grande: empresário oferece até R$ 72 mil a 150 possíveis candidatos em 2018

Silvia Zamboni/Valor
Mufarej: “Campanha custa dinheiro. E eu estou com muito medo da eleição do ano que vem.”
Por Ricardo Mendonça | De São Paulo
Organização ainda em fase de constituição, o chamado Renova Brasil afirma que distribuirá bolsas e financiará cursos de formação política para até 150 possíveis candidatos a deputado federal e estadual em 2018. Contemplados receberão ajuda mensal de R$ 5 mil a R$ 12 mil durante os seis primeiros meses do ano, o que poderá totalizar até R$ 72 mil por pessoa. Em contrapartida, terão que cumprir 240 horas de curso presencial e à distância. A ideia era reunir grandes empresários para bancar a operação. Mas até agora isso não foi possível. Fundador do grupo, o investidor e executivo Eduardo Mufarej afirma que, por enquanto, tudo sairá de seu próprio bolso.

O objetivo, diz, é incentivar o ingresso de nomes novos na política e ajuda-los na jornada. Considerando recrutamento, remuneração de instrutores, consultorias e bolsas, Mufarej estima que toda operação custará R$ 200 mil por aluno/candidato selecionado. Se esses números se confirmarem, o investimento total para “acelerar novas lideranças e viabilizar o acesso do cidadão comum ao Congresso”, como anuncia em seu site, poderá chegar a R$ 30 milhões.

Em pouco mais de um mês, a organização recebeu 4 mil fichas de inscrição, mais que o triplo da estimativa. Talvez tenha sido impulsionada pelas citações feitas pelo apresentador de TV Luciano Huck, amigo de Mufarej que era cotado para disputar a Presidência. São pessoas de todos os Estados (85% homens) que preencheram formulário e se submeteram a testes online, como um sobre posicionamento político “para identificar e eliminar extremistas”, diz a diretora-executiva, Izabella Mattar.

 

Agora, 12 recrutadores estão fazendo entrevistas para promover 320 nomes à próxima fase. Até a definição final de contemplados, 100 a 150, os interessados passarão por teste de antecedentes, banca e “teste de integridade resiliente”, diz Mattar, “atividade que indica os valores adotados pela pessoa para tomar decisões e quanto está suscetível para ceder a pressão ou se guiar por princípios”. O resultado final sai em 31 de dezembro.

Em seu site, o RenovaBR afirma ser apartidário e “ancorado nos valores da ética, da democracia, no diálogo e na vontade de servir à sociedade”. A única contrapartida exigida, diz, é a transparência.

A ficha de inscrição do programa pedia citação da filiação partidária do interessado. A organização cita que 55% dos 4 mil inscritos declararam que não possuem vínculo desse tipo, mas não informou a quantidade de inscritos por partido a respeito dos outros 45%. Citou apenas que recebeu pedidos de pessoas filiadas a 33 siglas, do esquerdista PSTU ao Patriota, futura agremiação do deputado presidenciável Jair Bolsonaro. A maioria das inscrições, disse Mufarej, é de pessoas filiadas ao que chamou de “novo ecossistema da política”. Siglas como o Novo e o Rede, citou.

Em janeiro, o RenovaBR disponibilizará uma conta para que qualquer pessoa física ou jurídica doe e ajude a financiar as bolsas. A identificação será opcional. “É sigilo do doador. A gente gostaria que todos divulgassem os nomes”, disse Mufarej. Caso a organização receba de outros empresários, o bolsista não saberá a origem da verba que poderá ir para sua conta.

Por que oferecer curso e dinheiro para possíveis candidatos? Mufarej responde: “Porque a vida das pessoas continua. A pessoa [que se candidatar] precisa continuar tendo que pagar água, luz, telefone… E é muito difícil se lançar candidato. Se você não criar condição mínima, a pessoa não vai. Nosso papel é ajudar”. Ele mantém o raciocínio mesmo ante a provocação de que sempre houve mais candidato do que vaga em eleições. “Sem dúvida. Tem muita gente que vê na política uma oportunidade. Mas não uma oportunidade de servir. A gente quer atrair quem quer servir”.

A grade do curso sai em janeiro. Por enquanto, informam que será baseada em cinco pilares. O primeiro engloba “autoconhecimento, liderança, propósito e resiliência”. Depois, “desafios do Brasil”. Na sequência, conhecimento legislativo. No quarto, o aluno define uma área de interesse, “que pode ir desde a primeira infância até sistema prisional”, explica Mufarej. No último, o aluno aprende a como estruturar uma campanha.

Entre as entidades de auxílio ao RenovaBR na operação estão a empresa Sociedade Brasileira de Coaching, o Centro de Liderança Política, do cientista político Luiz Felipe d’Avila, pré-candidato a governador de São Paulo pelo PSDB, e o movimento Awaken Love, do mestre espiritual Sri Prem Baba.

Nem todas as questões práticas estão resolvidas. Ainda não foi definido, por exemplo, como, exatamente, o dinheiro da bolsa será entregue ao aluno/candidato. Mas o empresário refuta que isso possa ser confundido com financiamento de campanha por parte de pessoa jurídica, modalidade proibida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2015. Até porque, ressalta, é possível fazer o curso e não participar da eleição. “Agora, se o cara quiser guardar o dinheiro e depois sair candidato, o dinheiro é dele, ele faz o que ele quiser.”

Mufarej lembra ainda que o pagamento de bolsas acaba antes das convenções partidárias, em julho. O calendário do RenovaBR, disse, foi pensado justamente para que as atividades não se sobreponham à fase de campanha.

Mufarej dá um senso de missão à iniciativa. “A gente tem uma postura que é um desserviço à sociedade: achar que o cara que quer se meter em política é ladrão, vai se sujar, só tem ladrão. Virou clichê. E a gente mesmo se vê reproduzindo isso. A gente é louco. Completamente louco. Como é que a gente pode fazer isso? Então minha reflexão é: chega desse ciclo.”

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