Caso eleito Bolsonaro deve priorizar “linha dura” para cargos jurídicos, mas não fala no assunto

O candidato a presidente Jair Bolsonaro (PSL) não tem dado muitas pistas sobre o que pretende fazer com os cargos jurídicos que terá sob sua responsabilidade caso seja eleito. O que tem deixado claro, até em entrevistas, é que gosta da “linha dura” do Judiciário e não dará atenção a quem considere ligado ao “viés ideológico de esquerda”.

Bolsonaro quer ministros do STF com o perfil do juiz federal Sergio Moro.
Miguel Ângelo/CNI

Se ganhar neste domingo (28/10), ele terá duas indicações ao Supremo Tribunal Federal, duas ao Superior Tribunal de Justiça e duas ao Tribunal Superior do Trabalho, além de dez desembargadores dos tribunais regionais federais, sem contar as cortes trabalhistas. Do governo, terá de nomear no mínimo o ministro da Justiça, o advogado-Geral da União e o diretor-geral da Polícia Federal, além de indicar um procurador-geral da República.

Não há muitas indicações de quem será indicado por Jair Bolsonaro (PSL) para as cortes superiores e demais cargos jurídicos se o capitão da reserva do Exército ganhar as eleições neste domingo (28/10). O que se sabe é que juízes “linha dura” são bem cotados pela campanha do deputado federal. Da mesma forma, são vagas ou inexistentes as suas propostas para o Judiciário, o Ministério da Justiça, a Advocacia-Geral da União, a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal.

O próximo presidente indicará dois integrantes do Supremo Tribunal Federal, já que os ministros Celso de Mello e Marco Aurélio, os dois mais antigos, se aposentam em 2020 e 2021, respectivamente. Em entrevista à TV Cidade, de Fortaleza, em junho, Bolsonaro foi perguntado se indicaria o juiz Sergio Moro para o STF.

“Da minha parte, tudo bem. Eu não sei se ele aceitaria integrar essa corte. Mas com pessoas do perfil dele, que o próximo presidente poderá indicar apenas dois, a gente muda, com toda a certeza, as decisões do Supremo Tribunal Federal, que, lamentavelmente, têm envergonhado a todos nós nos últimos anos”, respondeu o militar.

O presidente do PSL, Gustavo Bebianno, confirmou que Bolsonaro considera indicar Moro para o Supremo. “Seria bom que o STF recuperasse a sua credibilidade. Ter um ministro com o perfil do juiz Sérgio Moro seria muito bom. É um nome que se cogita, sim. Ele é uma pessoa séria, patriota e que quer o bem para o Brasil”, disse Bebianno em entrevista publicada na edição de domingo (21/10) do jornal O Estado de S. Paulo.

O ministro Ives Gandra Martins Filho, ex-presidente do TST, se encontrou com Bolsonaro na segunda-feira (22/10). Mas, segundo o site Jota, a conversa foi para tratar da reforma trabalhista. Ives já foi cotado para o Supremo, mas pelo presidente Michel Temer.

Outros magistrados que atuam na operação “lava jato” seriam considerados pelo capitão reformado, como o desembargador João Pedro Gebran Neto, da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, e Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, segundo a revista Veja. Gebran não é exatamente um juiz linha dura, mas é o relator da “lava jato” em segunda instância e tem mantido praticamente todas as decisões de Moro.

Após o primeiro turno das eleições, Bretas parabenizou, no Twitter, o filho do presidenciável Flávio Bolsonaro (PSL) e Arolde de Oliveira (PSD) por terem sido eleitos para representar o Rio no Senado. Os dois foram os únicos candidatos eleitos parabenizados pelo juiz federal. Por isso, ele foi intimadoa se explicar pelo corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins. Tanto a Lei Orgânica da Magistratura quanto o Código de Ética da carreira proíbem juízes de fazer manifestações políticas.

Fora os três magistrados da “lava jato”, que são identificados como símbolos de um combate a corrupção, Bolsonaro não tem dado indicações de como serão suas indicações para o Superior Tribunal de Justiça e para o Tribunal Superior do Trabalho. Ambos perderão dois ministros cada até 2022.

ConJur tentou contato com a assessoria de imprensa de Bolsonaro e com Gustavo Bebianno, mas não obteve resposta.

Mais ministros
Jair Bolsonaro não menciona o Supremo em seu programa de governo. Mas, em entrevista à TV Cidade, em junho, o capitão reformado do Exército disse ser favorável à ampliação do número de ministros da corte.

“A questão do Supremo, o que nós temos discutido, é, sim, aumentar para 21. Você pode falar ‘é um absurdo!’ Mas é uma maneira de você botar dez isentos lá dentro. Porque da forma como eles têm decidido as questões nacionais, nós realmente não podemos sequer sonhar em mudar o destino do Brasil. Eles têm poderes para muita coisa”, declarou Bolsonaro, citando como exemplo a possibilidade de o STF mudar de entendimento sobre a possibilidade de execução da pena após condenação em segunda instância.

A proposta de Bolsonaro evoca alteração feita na corte durante a ditadura militar (1964-1985). Por meio do Ato Institucional 2, de 1965, o general Castello Branco aumentou de 11 para 16 o número de ministros do STF. A ideia era diluir o poder dos magistrados indicados pelos presidentes João Goulart e Juscelino Kubitschek.

Em janeiro de 1969, três integrantes do Supremo foram sumariamente aposentados com base no Ato Institucional 5: Evandro Lins e Silva, Hermes Lima e Victor Nunes Leal. Os três eram considerados de esquerda pelos militares por terem ocupado cargos nos governos de Jango e JK. Ao tomarem notícia das cassações pelo programa Voz do Brasil, os ministros Antônio Gonçalves de Oliveira (então presidente do tribunal) e Antônio Carlos Lafayette de Andrada renunciaram aos seus postos.

Com a possibilidade de nomear cinco novos integrantes do STF, o presidente Costa e Silva restabeleceu, por meio do Ato Institucional 6, a composição da corte com 11 ministros.

Ministério da Justiça
O nome mais cotado para ser ministro da Justiça de um eventual governo Bolsonaro é o de Bebianno. Advogado, ele foi integrante do escritório Sergio Bermudes Advogados e diretor jurídico do Jornal do Brasil por indicação do próprio Bermudes, que o considera “uma pessoa correta”, mas “não é nenhum iluminado do Direito”.

“Não é nenhum iluminado do Direito. Mas é uma pessoa correta, cuja probidade não tenho o que questionar. Ele veio ao escritório me contar sobre sua proximidade com Bolsonaro e disse a ele que não concordo. Acho a pior das opções”, disse Bermudes ao jornal Folha de S.Paulo.

O criminalista Antônio Sérgio de Moraes Pitombo é outro possível ministro da Justiça de Bolsonaro. O advogado defendeu o capitão da reserva no STF da acusação de injúria racial por ofensa a quilombolas. A 1ª Turma da corte negou a denúncia por entender que o deputado federal não extrapolou a liberdade de expressão.

Bolsonaro foi acusado de racismo pela Procuradoria-Geral da República por causa de falas durante uma palestra que fez em 2017 no Clube Hebraica do Rio de janeiro. Na ocasião, o deputado contou que visitou uma comunidade quilombola e que “o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas”. Ainda citando a visita, disse: “Não fazem nada, eu acho que nem pra procriador servem mais”.

O desembargador Ivan Sartori, ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, é outra opção de Bolsonaro para a pasta. Ele já disse a colegas que vem pensando em se aposentar. E o próprio Sartori quem vem dizendo a magistrados paulistas que vem sendo cotado por Bolsonaro para ser ministro da Justiça.

O desembargador apoia o presidenciável abertamente. Recentemente, foi intimado a se explicar à Corregedoria Nacional de Justiça por causa da foto abaixo, publicada no Facebook.

Pessoas próximas ao desembargador acreditam que ele gostaria de seguir os passos de Alexandre de Moraes. Nomeado ministro da Justiça pelo presidente Michel Temer, Alexandre foi indicado para o STF assim que vagou uma cadeira da corte — no caso, a de Teori Zavascki, morto em um acidente de avião. Antes de ser nomeado ministro da Justiça, Alexandre de Moraes foi cotado para ser Advogado-Geral da União, parte importante da equipe jurídica do governo, mas sobre a qual Bolsonaro nunca falou.

Desembargador Ivan Sartori publica foto de apoio a Jair Bolsonaro (PSL).
Reprodução/Facebook

Sartori ficou nacionalmente famoso em 2016 por causa do discurso feito em seu voto pela absolvição e 73 policiais militares acusados de participar do massacre do Carandiru. A chacina aconteceu em 1992, quando a PM invadiu a penitenciária do Carandiru e matou 111 presos. Para Sartori, não houve provas de que os PMs tivessem matado os presos apontados pelo Ministério Público, mas o desembargador considerou que os policiais agiram em legítima defesa, porque haveria presos armados dentro do presídio — não há qualquer indício ou testemunho disso no processo. Diante da repercussão negativa de seu pronunciamento, Sartori acusou a imprensa de receber dinheiro do crime organizado.

Não há indicações da função que o Ministério da Justiça teria em um eventual governo Bolsonaro. Em fevereiro, a pasta foi esvaziada com a criação do Ministério da Segurança Pública, que, entre outras funções, passou a comandar a Polícia Federal — função antes exercida pela Justiça.

Lista tríplice

O nome do advogado Amilton Kufa também é citado por assessores e conselheiros de Bolsonaro. Ele é cotado para a AGU. Kufa trabalha na defesa do capitão reformado no Tribunal Superior Eleitoral junto com a mulher, Karina Kufa, coordenadora da equipe eleitoral.

Quanto à Procuradoria-Geral da República, Bolsonaro não se compromete com a lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República — o primeiro a seguir a lista foi Lula, em 2003, quando ele indicou Claudio Fonteles para o cargo. Em entrevista ao Jornal Nacional no dia 15 de outubro, Bolsonaro disse que escolheria alguém que considerasse “isento”, o que, segundo ele, seria alguém “livre do viés ideológico de esquerda”.

Também não existem sinalizações sobre que delegado poderia comandar a Polícia Federal, nem sobre o estilo de atuação da corporação caso Bolsonaro seja eleito.

Por Sérgio Rodas/CONJUR

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