Ou vocês ajudam a aprovar as reformas ou ficarão sem dinheiro, diz Paulo Guedes a governadores

CONGRESSO EM FOCO

Apesar de estarem presentes o presidente eleito Jair Bolsonaro, 19 dos 27 governadores com mandato a partir de janeiro, os presidentes do Senado e da Câmara e o ministro coordenador da transição, Onyx Lorenzoni, a estrela do encontro com os governadores, nesta quarta-feira (14) em Brasília, foi o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes.

Coube a ele o privilégio de fazer o pronunciamento final do evento, honra que normalmente cabe à autoridade máxima presente. Bolsonaro, no entanto, limitou-se a ouvir em silêncio o seu auxiliar apresentar em cores fortes, e sem retoques, o  figurino que pretende impor ao Brasil. Defendeu a “privatização acelerada”, o fim da “Bolsa-Empresário”, a redução de juros e a simplificação dos impostos. Em contrapartida, acenou com a garantia de mais dinheiro para os governos estaduais, ressaltando que o objetivo é “descentralizar o recurso” e colocar “o dinheiro onde o povo está”. Condicionou tal descentralização à ajuda dos governadores na aprovação das reformas administrativa e da Previdência e de outras medidas econômicas que serão submetidas ao Congresso.

“Somos prisioneiros da social democracia, estamos presos a ela há 30 anos”, resumiu, apontando no governo Sarney (1985/90) o início do ciclo de centro-esquerda. Conforme o economista, o caminho pretendido é o mesmo que “vários países já fizeram” e passa pela “regulamentação amistosa dos negócios”, pela redução dos impostos e da burocracia.

“Um ano e meio de sacrifício e acabou”, sustentou. “Se vocês apoiam as medidas de reforma do Estado, essa descentralização é rápida. Se vocês não apoiarem, ela é lenta. Sofre todo mundo mais tempo. Está nas mãos da classe política. Se a classe política fizer a reforma aceleradamente, o recurso é descentralizado rapidamente. Se fizer devagar, o recurso é descentralizado devagar. O desafio é comum”.

Ouça o pronunciamento de Paulo Guedes:

 

 

Governadores deixaram a reunião certos de que os planos de privatização de Paulo Guedes vão bem além do que se tem noticiado – sobretudo, investimentos e concessões na área de infraestrutura – e podem abranger todos os campos de atividade, incluindo saúde e educação. Isso ficou mais claro na parte em que ele respondeu a perguntas dos governadores, que não aparece na gravação acima. “A mensagem é: quem não quiser acompanhar o liberalismo, a gente dá voucher”, relatou uma autoridade presente no encontro. “Ouvi da boca dele: ‘Para os que não conseguirem acompanhar, que não tiverem igualdade de oportunidade, voucherVoucher saúde, voucher educação’”, contou.

Espantosa também, para alguns, foi a forma direta com que ele condicionou o acesso a recursos federais ao apoio à aprovação das reformas. “Nunca vi ninguém na política brasileira se manifestar de forma tão contundente a um grupo de governadores”, comentou um participante do encontro.

Durante a reunião, o governador eleito de São Paulo, João Doria (PSDB), demonstrou o traquejo de quem por muitos anos promoveu, como empresário, grandes eventos corporativos. Comandou o encontro com mão de ferro, determinando o roteiro, o tempo de fala de cada um e toda a dinâmica seguida.

Bolsonaro contra freio ambiental e indígena

Muito elogiado pelos governadores novatos que deram a tônica do evento, Jair Bolsonaro falou antes de Guedes e por bem menos tempo. Criticou as barreiras legais que, a título de proteger recursos ambientais ou preservar os interesses dos indígenas, impedem o crescimento econômico.

Tomou como exemplo o estado de Roraima, que, no seu entender, poderia ter um nível de desenvolvimento similar ao de Japão ou Coreia do Sul, não fosse o que ele considera entraves impostos pela legislação. Segundo um participante da reunião, o presidente disse: “Defendo o meio ambiente, mas não do jeito que está aí”.

Provocou alguma divergência a redação a ser dada na questão da estabilidade do funcionalismo. Os governadores mais próximos a Bolsonaro (entre eles, os de São Paulo, Rio e Minas) pretendiam incluir numa carta a ser divulgada conjuntamente a proposta de fim da estabilidade do funcionalismo público estadual. Renato Casagrande (PSB-ES) interveio, discordando do texto e propondo um texto que indicasse a necessidade de aprofundar a discussão do tema, o que foi aceito pelos demais.

Falaram no encontro, além dos governadores, Onyx e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE) – nos dois últimos casos, rapidamente e de forma quase protocolar. Dos nove governadores do Nordeste, somente o piauiense Wellington Dias (PT) compareceu, representando a região. Os governadores nordestinos ficaram de se reunir em Brasília no próximo dia 21.

Wellington Dias entregou a Jair Bolsonaro uma carta com as pautas prioritárias da região. Entre as demandas listadas estão a segurança pública, soluções para a crise hídrica e investimentos em ciência e tecnologia. Leia a íntegra da carta.

 

(Texto republicado às 21h49 em razão da necessidade de corrigir declarações reproduzidas de forma imprecisa na primeira versão desta reportagem. Na republicação, também colocamos à disposição a íntegra em áudio do discurso de Paulo Guedes aos governadores)

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