Para advogados, quebrar sigilo de Mariz é tentativa de criminalizar a advocacia

Por Ricardo Bomfim e Fernanda Valente/CONJUR

A quebra do sigilo bancário do escritório do advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira pelo juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, foi duramente criticada pela comunidade jurídica. Mariz foi advogado do ex-presidente Michel Temer até dezembro de 2018, sem cobrar honorários.

Advogados repudiaram decisão que quebra de sigilo bancário do escritório do criminalista Mariz de Oliveira
Marcelo Camargo/Agência Brasil

Criminalistas e julgadores procurados pela ConJur disseram que a decisão, ainda não divulgada, viola as prerrogativas da advocacia, fere o Estado Democrático de Direito e tenta criminalizar o direito de defesa.

A decisão, publicada no dia 15 de janeiro deste ano, também atingiu 15 empresas do grupo J&F. A informação foi divulgada nesta sexta-feira (15/2) pelo jornal O Globo.

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e a seccional do DF colocaram a Comissão de Prerrogativas ao dispor de Mariz. A OAB-SP, por sua vez, está se movimentando para judicializar a questão.

Veja abaixo as manifestações:

Lenio Streck, constitucionalista
“Eis aí o ovo da serpente sendo descascado. O que está acontecendo com os direitos constitucionais? A OAB deve tomar uma posição firme. Ou isso não terá mais limites. Esse tipo de decisão é autofágica. O Direito usado contra o Direito. Assim morrem as democracias.”

José Roberto Batochio, criminalista
“Inaceitável, intolerável, execrável! Esse inqualificável ato reclama o mais veemente repúdio da consciência democrática e da comunidade jurídica do país. É doloroso assistir ao assassinato das garantias libertárias por membros do Poder Judiciário, poder que a advocacia brasileira tanto defendeu do arbítrio militar nos anos de chumbo.”

Alberto Toron, criminalista
“Não conheço a decisão do juiz, mas conheço Antônio Cláudio Mariz há quase 40 anos. O suficiente para atestar sua absoluta correção na vida e no trato das coisas privadas e públicas, apesar do mau humor que o acomete às vezes. Amigo e mestre que ilumina os caminhos de mais de uma geração de advogados.”

Kenarik Boujikian, desembargadora e cofundadora da Associação Juízes para a Democracia
“O Dr. Mariz é um ícone da advocacia. O sigilo entre advogado e cliente é sagrado. Somente admissível a quebra de sigilo se o advogado pratica crime. Existe para que todos os princípios constitucionais sejam garantidos. Fazer diverso é apunhalar a democracia.
Que tempos!”

Pierpaolo Cruz Bottini, criminalista
“Todos conhecemos o trabalho de Mariz de Oliveira, sua seriedade e sua ética. Não se trata apenas de um ataque a um profissional respeitado, ou à advocacia. Ataca-se o próprio direito de defesa. Preocupante e lamentável.”

Augusto de Arruda Botelho, criminalista
“A quebra do sigilo bancário de uma empresa já uma medida extremamente invasiva e deve ser precedida de decisão fundamentada que demonstre concretamente a necessidade do afastamento desta garantia constitucional. A quebra do sigilo bancário de um escritório de advocacia — que não se tem notícia ser o escritório objeto de investigação, e sim seus clientes — constitui uma das mais graves violações ao Estado Democrático de Direito. A comunidade jurídica — incluindo aqui o fiscal da lei, o Ministério Público — deve de forma uníssona repudiar esse ataque ao exercício da advocacia.”

Fabio Tofic Simantob, presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD)
“A quebra do sigilo bancário do escritório do advogado Antonio Claudio Mariz de Oliveira configura claro abuso de poder, ilegalidade inaceitável, que precisa ser imediatamente esclarecida, responsabilizando-se civil e criminalmente os idealizadores desta criminosa investida contra a advocacia. É hora de dar um basta a estas ilegalidades patrocinadas pelos agentes da lei, travestidas de heroísmo oportunista e messiânico. Não se pode mais tolerar que agentes da lei sejam os primeiros a subjugar a legalidade. Quando agem assim, viram agentes da desordem e do caos. O advogado jamais pode ser confundido com seu cliente. O advogado é agente da Justiça, como o juiz e o promotor. Presumi-lo comparsa do cliente é a pior forma de subverter o sistema judiciário. É a mais grave agressão ao direito de defesa que pode haver. Urgem medidas imediatas e enérgicas para fazer cessar esta agressão, que não é contra renomado advogado Mariz de Oliveira, mas contra toda a advocacia brasileira.”

Marcelo Nobre, advogado
“É Inaceitável, impensável e inadmissível o gravíssimo ataque contra a Advocacia! As declarações de renda do escritório do respeitado advogado Antônio Cláudio Mariz estão entregues e não podem ser alteradas unilateralmente. Qual a verdadeira intenção desta violência por parte do Poder Judiciário contra a advocacia? Por que o juiz não intimou o escritório a apresentar defesa sobre algo específico levantado pela Receita Federal ou pelo Ministério Público como determina a Constituição Federal?  Democracia não é apenas alternância no poder!!!”

Marcus Vinicius Furtado Coêlho, advogado constitucionalista
“Os honorários dos advogados estão protegidos pela cláusula da inviolabilidade profissional, previstos na Constituição e na lei estatutária, assim reconheceu o STF quando impetramos a medida em favor da advogada Beatriz Cata Preta. Tal ofensa viola a dignidade do advogado, fere o núcleo do direito de defesa e agride o devido processo legal. Mariz é advogado ético e exemplar.”

Daniel Bialski, criminalista
“É um absurdo se confundir a pessoa do advogado com a pessoa do cliente do advogado. Esta é uma violação injustificável das prerrogativas e coloca em risco a própria independência com que o advogado exerce sua função. O Dr. Mariz é um dos advogados mais respeitados, não somente da atualidade, mas da história do Brasil. Espero que a Ordem dos Advogados do Brasil levante esta bandeira contra tal arbitrariedade.”

Leonardo Isaac Yarochewsky, criminalista
“A quebra do sigilo de Antonio Claudio Mariz de Oliveira — um dos ícones da advocacia criminal do país — atinge a todos os advogados e todas advogadas do Brasil. Não é despiciendo lembrar que ao tratar dos direitos e garantias fundamentais a Constituição da República de 1988 prevê em seu artigo 5º, inciso XII que é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Necessário martelar que quando um advogado é assaltado em seus direitos e em suas prerrogativas, especialmente, como defensor da liberdade do imputado, é a democracia que sai ferida.”

Guilherme Batochio, criminalista
“A inviolabilidade do advogado e a indevassabilidade do seu escritório têm previsão constitucional e legal. Não se concebe que, para se investigar o cliente, se pretenda ou se possa perscrutar a atividade profissional do advogado. O excepcionamento do seu sigilo somente se justificaria na hipótese de ele ter concorrido, de alguma forma para o cometimento de eventual delito. Não sendo esse o caso, a quebra do sigilo, a par de se traduzir em manifesto e descabido arbítrio, pode até configurar ilícito penal, na forma do que prescreve a Lei Complementar 105/01.”

Ticiano Figueiredo, criminalista
“Isso é uma violência contra o Estado Democrático de Direito. O Mariz é respaldado pelos institutos morais da nossa instituição. É um ataque contra a democracia e uma virada do Ministério Público contra a advocacia, que é a profissão mais nobre da administração da Justiça. Nesse caso, há um abuso do Judiciário para atingir a advocacia.”

Fernando Castelo Branco, criminalista
“Lembro-me de recente e firme manifestação do Supremo Tribunal Federal sobre situação análoga, em que tentou-se transformar advogados em investigados, subvertendo a ordem jurídica. Para se preservar a higidez do devido processo legal e, em especial, o equilíbrio constitucional entre o Estado-acusador e a defesa, é inadmissível que autoridades com poderes investigativos desbordem de suas atribuições para transformar defensores em investigados. São, pois, ilegais quaisquer incursões investigativas sobre a origem de honorários advocatícios, quando, no exercício regular da profissão, houver efetiva prestação de serviços profissionais.”

Luiz Flávio Borges D’Urso, ex-presidente da OAB-SP, doutor pela Faculdade de Direito da USP
“É inadmissível, inconstitucional e absurda a quebra do sigilo bancário do escritório de advocacia Mariz de Oliveira, pois jamais se pode confundir o advogado com seu cliente. Isto representa ataque à advocacia, às prerrogativas profissionais dos Advogados e ao próprio Estado Democrático de Direito”.

Antônio Carlos de Almeida Castro (Kakay), criminalista
“Um dos atos mais arbitrários dos últimos tempos. Tenho andado o Brasil inteiro nos últimos três anos, desde que foram se acumulando os excessos da ‘lava jato’, que fez com que, de certa forma, banalizasse as diversas ações repressivas como excesso de prisão preventiva, de delação. E com certeza estamos vivendo um momento de criminalização da advocacia criminal. É muito grave, pois somos nós que estamos na trincheira da defesa dos direitos fundamentais, da defesa da Constituição. Primeiro fizeram uma manifestação que parecia pueril, mas foi se tornando grave que é de certa forma colocar em xeque o advogado pelo fato de ele ter a coragem e independência de defender teses em nomes de clientes que são massacrados pela grande mídia e pelo Judiciário. A quebra de sigilo bancário de um advogado que já foi presidente da Ordem, com a estatura do Mariz, representa a definição de um confronto. A OAB tem que agir imediatamente, o Conselho Federal tem que determinar uma comissão para ingressar com Habeas Corpus e impedir que essa quebra de sigilo se efetive.”

Fernando Augusto Fernandes, advogado criminalista, doutor em ciência política
“Esta quebra de sigilo representa um abuso de autoridade que merece imediata e dura atuação da OAB, que já se manifestou, assim como de toda a classe da advocacia! Sobral dizia que a advocacia não é para covardes e saibam todos que a advocacia não será encurralada e não se acovardar diante desses ataques. Certamente esses abusos terão consequências criminais, administrativas e internacionais contra os que pretendem impedir o exercício da defesa. Não haverá imunidade para esses abusos! Não nos curvamos as ditaduras e não faremos isso em tempos modernos”

Renato de Mello Jorge Silveira, presidente do Iasp
“O Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp) recebe com muita preocupação a informação de quebra de sigilo bancário do advogado Antonio Cláudio Mariz de Oliveira por parte da 10ª Vara Criminal de Brasilia. A situação, além de violar as mais básicas prerrogativas profissionais, mostra-se com tons de prejulgamento do advogado, confundindo-o com a figura de seus clientes. O Iasp acompanhará os trâmites processuais nos próximos dias, na busca de defesa do Estado de Direito.”

Ana Amélia Camargos, vice-presidente da comissão de Direitos Humanos da OAB-SP
“A quebra de sigilo bancário de escritórios de advocacia se equipara a um golpe de Estado. É um golpe à democracia e ao amplo direito de defesa. Significa retirar do cidadão o seu direito de defesa contra arbitrariedades. Prerrogativas da advocacia são para defender o cidadão. Proteger a advocacia significa proteger o cidadão.
O que aconteceu com o Dr. Mariz, símbolo da advocacia brasileira, é uma tentativa de calar o cidadão é um desrespeito aos advogados.
A OAB-SP irá reagir com a mesma veemência que significa essa arbitrariedade.”

Leonardo Sica, criminalista e ex-presidente da Aasp
“A decisão é uma agressão ao Estado de Direito. O livre exercício da advocacia é essencial para a realização da justiça, para o equilíbrio da vida social. Porém, os membros da ‘cruzada judiciária’ não entendem assim, acham que o advogado é um obstáculo… barreira contra o seu desejo mal disfarçado de aumentar o próprio poder e exercê-lo sem controle.”

Marco Aurélio de Carvalho, advogado
“Gravíssima a notícia de quebra de sigilo do escritório do advogado Antonio Cláudio Mariz. Não há justificativa que a sustente. Referência para todos nós, pela atuação combativa e pelo comportamento sabidamente ético, o Dr. Mariz não é sequer investigado no processo em questão. A advocacia reagirá com a força necessária.”

Fernando Hideo Lacerda, advogado
“A ofensiva autoritária avança a passos largos por medidas de exceção desferidas com o propósito de anular o direito de defesa. A semana começou com a notícia do desvio de finalidade da Receita Federal, usurpando atribuições dos órgãos de investigação criminal para intimidar um ministro do STF, e se encerra com a decisão da Justiça Federal de Brasília, que transforma defensores em investigados, subvertendo a ordem constitucional e anulando a essência da democracia. O processo penal de exceção se caracteriza pela manipulação do sistema de justiça criminal como arma de guerra deflagrada contra a soberania popular.”

Maíra Beauchamp Salomi, advogada
“É lamentável que, em um Estado Democrático de Direito, defensores se tornem investigados pela regular execução de seu mister. Se prestação de serviço houve, não cabe qualquer investigação sobre a origem de honorários advocatícios.”

Bruno Salles Ribeiro, advogado
“É simplesmente estarrecedora a notícia da invasão da privacidade e do sigilo bancário do escritório Advocacia Mariz de Oliveira. O Ministério Público e o Judiciário vêm gradativamente destruindo os alicerces do Estado de Direito e, desta feita, atingiram um pilar fundamental de qualquer sociedade civilizada: o sagrado direito de defesa.”

Daniella Meggliolaro, criminalista
“A quebra do sigilo bancário do escritório Mariz de Oliveira, sob o singelo pretexto de que seus integrantes advogam para o ex-presidente da República Michel Temer, é um dos mais duros ataques ao direito de defesa presenciados nos últimos tempos. Criminalizar a advocacia é expediente ilegal e incompatível com um estado que se diz democrático de direito.”

Rodrigo R. Monteiro de Castro, presidente do Movimento de Defesa da Advocacia
Eduardo Perez Salusse, presidente do Conselho

O advogado não pode ser confundido com os seus clientes. É detentor da prerrogativa constitucional necessária a conferir-lhe independência para exercer o papel fundamental de viabilizar o acesso à justiça por todos aqueles que sofrem ameaça ou lesão aos seus direitos.
Medidas que objetivem atingir o advogado por atos de um cliente revestem-se de ilegalidade, representando inaceitável afronta ao Estado de Direito. Sem advogado independente não há ampla defesa, não há devido processo legal, não há justiça, não há democracia! Ao contrário: institui-se o estado de barbárie e de terror.
O Movimento de Defesa da Advocacia – MDA repudia os excessos cometidos por parte de qualquer autoridade que ameacem conquistas sociais e individuais tão duramente obtidas, o que aparenta ter ocorrido com a quebra de sigilo bancário do escritório Mariz de Oliveira.
O MDA não poupará esforços para combater os abusos e as ilegalidades, tampouco para exigir a apuração dos fatos e a punição dos agentes que atentarem contra o Estado de Direito.

Guilherme San Juan, criminalista
“Não conheço o conteúdo da decisão, mas repúdio a violência desmedida decorrente da quebra de sigilo bancário do escritório de advocacia, sobretudo criminal, sob o argumento de investigar fatos relacionados a seus clientes. É fundamental que a OAB se posicione. É inaceitável uma violência como essa, que não recai somente contra Mariz, mas contra toda a advocacia. Não tenho registro de fatos semelhantes nem mesmo no período mais duro da ditadura.”

Cristiano Zanin Martins, advogado
“A tentativa de criminalização da advocacia faz parte de uma realidade perversa e obscurantista que se instalou no nosso país. Há uma clara atuação do Estado objetivando inibir o advogado de exercer a função essencial à administração da Justiça, assegurada pela Constituição Federal, assim como de inibir a defesa das garantias fundamentais no âmbito de toda a comunidade jurídica. O doutor Mariz de Oliveira é um advogado que merece toda a admiração e o respeito dos profissionais do Direito.”

João Paulo Martinelli, advogado criminalista
“É um absurdo quebrar o sigilo bancário de um advogado sem qualquer indício de que se tenha cometido um crime. O advogado não se confunde com o cliente. Só há possibilidade de quebra de sigilo se houver indícios mínimos de que o advogado tenha agido como cúmplice do cliente acusado. Um advogado com a história e a reputação do Mariz não merece esse tratamento.”

Vera Chemin, constitucionalista
“Há jurisprudência na corte sobre o tema. A quebra de sigilo bancário só se justifica quando for devidamente fundamentada por autoridade judicial competente para tal, conforme prevê o inciso IX do artigo 93 da CF. O mero requerimento do MP ou da autoridade policial não é suficiente para a quebra de sigilo bancário. É indispensável a fundamentação para esse procedimento com base em fortes indícios de envolvimento do ora suspeito e do seu escritório de advocacia. O estatuto do advogado prevê essa exceção baseado em supostos atos ilícitos do advogado. Assim, o sigilo bancário deve ser a regra e só deve ser quebrado quando se tratar de interesse público e de se conhecer o destino de recursos públicos.”

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