STF abusou de seu poder ao barrar diretor da PF escolhido por Bolsonaro?

Governo perdido

Mariana Schreiber – @marischreiber – Da BBC News Brasil
Poucas horas antes da cerimônia prevista para dar posse a Alexandre Ramagem como diretor-geral da Polícia Federal nesta quarta-feira (29/04), o ministro do Superior Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes vetou a nomeação por entender que há indícios suficientes de que o presidente Jair Bolsonaro o escolheu com intuito de intervir em investigações.

A decisão provocou forte reação de apoiadores de Bolsonaro, que acusam o STF de invadir poderes garantidos legalmente ao presidente.

“Nunca se viu tanta interferência em um governo em uma democracia”, criticou a deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), uma das mais fiéis defensoras de Bolsonaro no Congresso, ao comentar a decisão de Moraes.

A questão dividiu especialistas ouvidos pela BBC News Brasil. Para o ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp, Moraes agiu corretamente ao preservar os princípios da moralidade e impessoalidade da administração pública previstos na Constituição.
Já os professores de Direito Eloísa Machado (FGV) e Rafael Mafei (USP) criticam a escolha de Ramagem para a direção da PF, mas veem problemas legais no caminho adotado pelo ministro do STF para impedir a nomeação.

Ramagem é delegado da Polícia Federal há 15 anos e já atingiu o topo da carreira, a chamada classe especial, que é o único requisito previsto na legislação brasileira para poder ser nomeado diretor da instituição pelo presidente.

No entanto, sua nomeação passou a ser vista como tentativa de Bolsonaro de controlar investigações da PF porque Sergio Moro se demitiu do Ministério da Justiça na semana passada acusando o presidente de estar tentando intervir no órgão.

Amizade com a família

Ramagem se aproximou da família presidencial depois que assumiu a coordenação da segurança de Bolsonaro durante a eleição de 2018. Ele se tornou, assim, amigo de filhos de presidente e, desde janeiro de 2019, ocupa cargos no governo — primeiro foi assessor especial da Secretaria de Governo, quando a pasta era comandada pelo general Carlos Alberto dos Santos Cruz, e depois se tornou diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

A ação pedindo que Ramagem fosse impedido de tomar posse foi apresentada pelo PDT. Ao acolher a solicitação do pedido Moraes ressaltou o risco de que a Polícia Federal fosse utilizada para interesses privados de Bolsonaro e sua família.

“(…) A finalidade da revisão judicial é impedir atos incompatíveis com a ordem constitucional, inclusive no tocante as nomeações para cargos públicos, que devem observância não somente ao princípio da legalidade, mas também aos princípios da impessoalidade, da moralidade e do interesse público”, escreveu ele.

O ministro argumento que o próprio Bolsonaro reconheceu que buscava ter acesso a informações da Polícia Federal, citando essa declaração do presidente em pronunciamento na sexta-feira: “Sempre falei para ele: Moro, não tenho informações da Polícia Federal. Eu tenho que todo dia ter um relatório do que aconteceu, em especial nas últimas vinte e quatro horas, para poder bem decidir o futuro dessa nação'”.

Para Gilson Dipp, ex-ministro do STJ, as acusações de Moro e a proximidade de Ramagem com a família Bolsonaro são suficientes para embasar a decisão de Moraes. Na sua leitura, a nomeação dele para comandar a PF feria o Artigo 37 da Constituição, que prevê que a administração pública deve ser norteada pelos princípios de impessoalidade e moralidade.

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