“Escola sem partido” acirra polêmica na educação

Proposta do deputado saco preto, Rogério Marinho(PSDB) propõe prender professores

Em meio às discussões sobre falta de investimentos de valorização dos educadores no Brasil, uma nova queda de braço tem provocado debates acirrados no Congresso Nacional, em assembleias legislativas e câmaras municipais e rendido debates acalorados nas redes sociais e no movimento sindical. É a proposta que institui a chamada Escola sem Partido (ESP). Nos últimos anos, diversos projetos de lei se espalharam país afora pretendendo coibir o que os seus autores chamam de processo de ideologização dentro da sala de aula. Uma das proposições prevê até previsão de cadeia para docentes

A polêmica sobre o assunto é um dos destaques da mais nova edição da Revista Congresso em Foco. Para os defensores da proposta, é preciso aprová-la para coibir a “doutrinação” que, segundo eles, é promovida pelos professores sobre os estudantes. Já quem defende a rejeição do projeto vê no movimento uma tentativa de amordaçar os educadores e de impedir a formação de cidadãos de fato.

Neutralidade política

Autor do Projeto de Lei 867/2015, o deputado Izalci Lucas (PSDB-DF) defende a “neutralidade política, ideológica e religiosa do Estado, como reconhecimento da vulnerabilidade do educando como parte mais fraca na relação de aprendizado”. “Não é mordaça, nada disso do que estão falando, muito pelo contrário. O que estamos propondo já está na Constituição, só reforçamos a ideia de pluralismo no ensino brasileiro”. O pluralismo passa longe das salas de aula, segundo ele.

Izalci afirma que a ideia não é fiscalizar nem punir ninguém. Para ele, o projeto soa como espécie de alerta de que o professor não pode nem deve fazer o que quer em sala de aula. “Não podemos aceitar só o discurso petista, induzindo os alunos, desde o ensino infantil. E essas crianças influenciam os pais, especialmente em época de eleições. Queremos a discussão de todas as ideologias, queremos a fala de todos os partidos”, afirma.

Censura

“Esse projeto de lei é uma tentativa de censurar o professor”, resume o senador Cristovam Buarque, deixando claro que existe, sim, doutrinamento nas salas de aula, o que ele também condena. No entanto, o senador ressalta que a imensa maioria dos professores não tem partido, o que não justifica a existência de uma lei dessa natureza.

Cristovam define o projeto como desproposital, considerando a realidade da educação no país; e desproporcional, pois, pensando numa minoria, cria constrangimento para toda a categoria. Diferente do que pensam os adeptos da Escola Sem Partido, o ex-ministro da Educação argumenta que, pra início de conversa, alunos não são a parte mais fraca nessa relação.

“Estudantes não são desprovidos de ideias, pensamentos próprios. E esses raríssimos professores que tentarem transformar salas de aula em palanques vão se chocar com aqueles alunos que não aceitam ser manipulados”.

A reportagem mostra que a primeira iniciativa para instituir a Escola sem Partido partiu do Legislativo fluminense, com um projeto de lei do deputado estadual Flávio Bolsonaro, filho do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ). O texto do PL 2.974/2014 proíbe a ideologização partidária na grade curricular e em materiais didáticos.

Exemplo mais radical é o PL 1.411/2014, do deputado federal Rogério Marinho (PSDB-RN), também conhecido por ‘saco preto’ prevê até pena de prisão para o professor acusado de “assédio ideológico”. Ou seja, tipifica esse tipo de assédio como crime.

Liberdade ou histeria?

Mentor do movimento nacional e coordenador do site ESP, o advogado Miguel Nagib avalia que há uma confusão sobre liberdade de expressão e liberdade de cátedra. Nagib explica que liberdade de expressão é a liberdade de dizer qualquer coisa sobre qualquer assunto. E, se o professor desfrutasse disso em sala de aula, sequer poderia transmitir aos alunos o conteúdo de sua disciplina, pois poderia passar toda a aula falando de futebol, por exemplo. “Professor não desfruta e não pode desfrutar da liberdade de expressão no exercício da atividade docente”, sentencia.

Professor titular de Metodologia da História na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), Marcos Silva encara a postura dos defensores da ESP como “histeria antipolítica”, com graves riscos para a liberdade. “A independência de pensamento crítico é uma meta fundamental da escola. E essa meta depende, sim, de professores que trabalham com independência”, alerta o professor.

Leia a íntegra da reportagem na Revista Congresso em Foco