E-mails apreendidos pela Polícia Federal, obtidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, mostram lobistas discutindo detalhes do acerto financeiro a ser feito pela Medida Provisória 471, sob suspeita de ter sido “comprada” para favorecer empresas do setor automobilístico. Nas mensagens, eles vinculam o pagamento de parcelas por montadoras de veículos às fases de aprovação da norma: primeiro, a edição do texto, pelo governo; em seguida, a votação pelo Congresso.
A MP foi assinada em 20 de novembro de 2009 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em um e-mail de 12 de fevereiro de 2010, o lobista Alexandre Paes dos Santos, conhecido como APS, diz a um de seus parceiros no negócio, o advogado José Ricardo da Silva, dono da SGR Consultoria, que caberia à MMC Automotores, empresa que fabrica veículos Mitsubishi no Brasil, pagar R$ 1,5 milhão, em parcelas de R$ 125 mil, nos primeiros 12 meses após a edição da norma.
Os recursos, segundo APS, seriam repassados a título de “assessoria jurídica”. Mais pagamentos, acrescentou ele, deveriam ser feitos após o Congresso votar o texto da MP. “Esse valor é independente do que será pago após a sanção do Senado Federal e a publicação de forma definitiva, onde (sic) terão outro valor a ser pago”, acrescenta.
A MP 471 foi aprovada em março no Legislativo, que a converteu na Lei 12.218 sem fazer alterações no texto original.
Como o jornal vem mostrando numa série de reportagens, os valores negociados pelos lobistas com as montadoras chegaram a R$ 36 milhões. A PF e o Ministério Público Federal apuram qual foi o montante efetivamente desembolsado. Um outro e-mail, trocado por envolvidos nas negociações, diz que, para viabilizar a MP, houve oferta de propina a “pessoas do governo”, o que está em investigação.
A SGR, de José Ricardo, teria atuado em “consórcio” com outra empresa, a Marcondes & Mautoni Empreendimentos, para viabilizar a MP no governo e no Legislativo. Além da MMC Automotores, as tratativas envolveram a Caoa, que monta veículos da Hyundai.
A defesa de APS informou que não se pronunciaria, pois não teve acesso às investigações. A SGR negou que a empresa tenha feito lobby pela MP ou participado de corrupção. Em nota, explicou ter trabalhado no caso da MP prestando consultoria em direito tributário. Sobre a atuação de APS, a empresa sustentou que a sua participação “foi a de viabilizar a realização de estudos de impacto ambiental nas regiões em que as empresas beneficiadas atuavam”.
A MMC Automotores sustenta que não firmou qualquer contrato com a SGR, mas contratou a Marcondes & Mautoni para desenvolver “estudos que demonstrassem as vantagens que a extensão do benefício fiscal concedido propiciava”. A Caoa alega que “jamais contratou ou pagou qualquer consultoria ou empresa para a tramitação” da MP, mas admite que teve vínculo com a Mautoni. A Marcondes & Mautoni não se pronunciou.