CASO ABIN E IMPEACHMENT: Bolsonaro acumula mais de 50 pedidos de cassação por crimes de responsabilidade – VEJA OS MOTIVOS

Carlos Eduardo Alves e Bolsonaro fizeram campanha juntos.

Impeachment. A palavra, muitas vezes difícil de escrever, deriva do latim impedicare, que significa capturar, caçar (ou cassar). Adaptada de diversos idiomas até chegar no inglês – do latim foi ao francês, do francês ao inglês. E do inglês chegou ao Brasil: depois da redemocratização, desembarcou em 1992 e se hospedou em Collor. 24 anos depois, atingiu Dilma Roussef. E agora pode fazer mais uma vítima.

Jair Bolsonaro é o presidente que mais recebeu pedidos de impeachment na história do Brasil. Até novembro, eram 56 processos arquivados na gaveta do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). E esse número tende a aumentar. Isso porque, o caso da Abin, a Agência Brasileira de Inteligência, possivelmente ter produzido relatórios para ajudar na defesa de Flávio Bolsonaro, é um prato cheio, mas para deixar o presidente com fastio.

Caso Abin

A revista Época revelou que a Abin produziu, pelo menos, dois relatórios para ajudar na defesa de Flávio Bolsonaro no caso das “rachadinhas” da Alerj, envolvendo Fabrício Queiroz, quando o, hoje senador, era deputado estadual pelo Rio de Janeiro.

De acordo com a reportagem, os dois documentos foram recebidos em setembro por WhatsApp por Flávio, que os repassou para sua advogada Luciana Pires.

Segundo a revista, um deles traz no campo “Finalidade” o objetivo de auxiliar o filho do presidente: “Defender FB no caso Alerj demonstrando a nulidade processual resultante de acessos imotivados aos dados fiscais de FB”. Nesse relatório, diz a “Época”, a Abin aponta uma ‘linha de ação’ para cumprir a missão: “Obtenção, via Serpro, de ‘apuração especial’, demonstrando acessos imotivados anteriores (arapongagem)”.

O texto obtido pela revista também aborda a dificuldade para a obtenção dos dados pedidos à Receita Federal (RFB).

No mesmo dia, o governador do Maranhão, Flávio Dino, ex-juiz federal, afirmou que o caso, além de crime de responsabilidade, é também crime comum e improbidade administrativa. Com isso, se provado, justifica o impeachment do presidente.

A advogada de Flávio Bolsonaro, Luciana Pires, confirmou o recebimento dos relatório, mas disse que as orientações, vindas do diretor-geral da Abin, Alexandre Ramagem, estavam fora do alcance da defesa, por envolverem ações do Executivo e que não os usou.

“Não fiz nada. Não vou fazer nada do que ele (Ramagem) está sugerindo. Vou fazer o quê? Não está no meu escopo. Tem coisa que eu não tenho controle”, disse a defensora.

STF cobra explicações; Abin, GSI e Bolsonaro negam e PGR está investigando

Questionados sobre a veracidade dos documentos obtidos pela Revista Época, o diretor geral da Abin, Alexandre Ramagem, o general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e o próprio presidente Jair Bolsonaro, negaram a produção de relatórios.

A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármem Lúcia pediu esclarecimentos aos órgãos, que voltaram a negar. Em despacho, Cármen afirmou que o caso “é grave” e aponta para descumprimento de decisão da Corte, que firmou entendimento de que a Abin somente pode fornecer dados quando comprovado o interesse público da medida e sob controle do Judiciário, ficando vedado o repasse de informações de inteligência com objetivo de atender interesses pessoais ou privados.

O Procurador-Geral da República, Augusto Aras afirmou que o caso “é grave, mas precisa ser investigado”. Aras afirmou que “ainda faltam provas para confirmar o episódio”.

O encontro entre Bolsonaro, Ramagem e Heleno é alvo de uma apuração preliminar na PGR, que apura se há indícios suficientes para abrir inquérito contra eles.

Caso Abin justifica impeachment?

Se confirmado o uso de uma instituição federal para fins particulares, há motivos sim para o impeachment de Bolsonaro. Mas não é tão simples assim. Um processo de impeachment leva tempo, como estamos muito bem lembrados, afinal não faz tempo que presenciamos um.

Primeiro, o presidente da Câmara, hoje Rodrigo Maia, teria que aceitá-lo. Maia já afirmou que ‘não é o momento para isso’, pois ‘tiraria o foco da covid’: “Entendo parte da sociedade que está ficando com muita aflição e raiva do governo pela péssima condução da pandemia, e principalmente agora pelo caso da vacina, mas o processo de impeachment é político e precisa ser tomado com muito cuidado para não tirar o foco da pandemia (…) Não há condições para se avaliar esse tema, o que não quer dizer que eu avaliaria nem positivamente nem negativamente. Não considero omissão da minha parte”.

Além disso, se aberto, Bolsonaro possivelmente se livraria desse processo, por ter votos suficientes para evitar a cassação. Hoje, o presidente conta com o apoio do Centrão, e dificilmente teria 342 votos contra, o mínimo necessário para o processo ir ao Senado.

Outro ponto a ser considerado são as eleições para à presidência da Câmara, caso o candidato apoiado por Maia vença a disputa, é possível que um desses processos sejam abertos. No entanto, se Arthur Lira, apoiado por Bolsonaro, for eleito, é um forte indicativo que o presidente terminará seu mandato, caso nenhum fato novo, como um racha político com o Centrão, surja.

Crimes de responsabilidade de Bolsonaro

Os 50 pedidos de cassação do presidente são anteriores ao caso da Abin e também têm motivações fundamentadas. Maioria deles são embasados em agressões a Lei 1.079. Em 70 anos de vigência da Lei 1.079, Bolsonaro é o presidente que mais incidiu em crimes nessa natureza. E com menos de 2 anos de mandato.

Bolsonaro cometeu crimes como: disparo de fake news e de pornografia, desrespeito aos direitos humanos, falta de decoro, falsidade ideológica, prevaricação, obstrução de Justiça, corrupção passiva, ação caluniosa, obstrução jurídica, e má conduta durante o auge da pandemia, quando ele provocou várias aglomerações.

Ricardo Pantin, advogado e professor de direito constitucional, afirma que as denúncias contra Bolsonaro recebidas pela Câmara estão baseadas em inúmeros crimes de responsabilidade e de ameaça à democracia e à soberania: “As denúncias destacam declarações que atentam contra as instituições republicanas, à saúde dos brasileiros em tempos de pandemia e obstrução da justiça e advocacia administrativa, questões muito graves para o presidente da Câmara ficar inerte”.

Pantin lembra ainda que essa lista de denúncias contra Bolsonaro coloca o crime das pedaladas, que retirou Dilma Rousseff da presidência, como um delito menor: “Aliás, a perícia apontou no caso de Dilma que não houve crime de responsabilidade, mas o impeachment já tinha se consolidado”, destaca.

E agora?

Impeachment, reforço, requer mais do que o cometimento de um crime de responsabilidade. Essa é a condição necessária, mas não suficiente em terras brasileiras, ainda que sejam muitos os crimes. O impeachment também requer condições políticas, com uma economia em crise (que há). A crise está aí, com um rombo recorde de R$ 247 bi previstos para 2021. E Bolsonaro, a cada dia, cria mais condições políticas para deixar o Palácio da Alvorada.

Abaixo, apenas 10 dos crimes de responsabilidade cometidos pelo presidente, Bolsonaro agrediu a lei ao:

1- dar apoio às manifestações em plena pandemia e ter feito uma convocação para os atos em entrevista em Roraima, em março. É crime.

2 – ao declarar, em Miami, que as eleições de 2018 foram fraudadas. É crime.

3 – ao postar conteúdo pornográfico no Carnaval do ano passado. É crime.

4 – ao mandar comemorar o golpe militar de 1964, também no ano passado. É crime.

5 – ao praticar ofensas de cunho sexual contra a repórter Patrícia Campos Mello, da Folha. É crime.

6 – ao ignorar lei federal (Artigo 268 do Código Penal) e atuar de modo temerário, criando facilidades para a expansão do coronavírus. É crime.

7 – ao, também em Miami, afirmar que as manifestações contra o Congresso poderiam arrefecer se Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre abrissem mão da parcela do Orçamento impositivo. É crime.

8 – ao flertar com a greve de PMs no Ceará, reconhecendo a suposta legitimidade do movimento. É crime.

9 – ao afirmar abertamente que foi à CIA para tratar da deposição de Nicolás Maduro. É crime.

10 – ao permitir que ministro, sob o seu comando, demitisse de cargo de confiança um fiscal que o havia multado por pesca irregular quando ainda deputado. É crime.

 15 agressões de Bolsonaro à lei 1.079 do impeachment

Do Artigo 5º – cometer ato de hostilidade contra nação estrangeira, expondo a República ao perigo da guerra, ou comprometendo-lhe a neutralidade;

Do Artigo 6º – tentar dissolver o Congresso Nacional, impedir a reunião ou tentar impedir por qualquer modo o funcionamento de qualquer de suas Câmaras; – opor-se diretamente e por fatos ao livre exercício do Poder Judiciário, ou obstar, por meios violentos, ao efeito dos seus atos, mandados ou sentenças; – praticar contra os poderes estaduais ou municipais ato definido como crime neste artigo; – intervir em negócios peculiares aos Estados ou aos Municípios com desobediência às normas constitucionais.

Do Artigo 7º – servir-se das autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder, ou tolerar que essas autoridades o pratiquem sem repressão sua; – subverter ou tentar subverter por meios violentos a ordem política e social; – incitar militares à desobediência à lei ou infração à disciplina; – provocar animosidade entre as classes armadas ou contra elas, ou delas contra as instituições civis; – violar patentemente qualquer direito ou garantia individual constante do art. 5º e bem assim os direitos sociais assegurados no artigo 6º da Constituição.

Do Artigo 8º tentar mudar por violência a forma de governo da República; – tentar mudar por violência a Constituição Federal ou de algum dos Estados, ou lei da União, de Estado ou Município; – praticar ou concorrer para que se perpetre qualquer dos crimes contra a segurança interna, definidos na legislação penal; – permitir, de forma expressa ou tácita, a infração de lei federal de ordem pública;

Do Artigo 9º – proceder de modo incompatíve com a dignidade, a honra e o decoro do cargo.

*Com informações de Reinaldo Azevedo, Correio Brasiliense e Samuel de Brito

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