Em entrevista ao Correio Braziliense, o polemista odiado por ativistas de direitos humanos e minorias, mas recebido com festa em aeroportos do país por gente que empunha bandeiras conservadoras, Jair Bolsonaro (PP-RJ), 60 anos, vive o momento de maior destaque na trajetória política, iniciada em 1991, com o primeiro mandato de deputado federal. Ele votou em Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para a presidência da Câmara, em fevereiro, mas acha que a situação do peemedebista é complicadíssima, por causa de toda a documentação mostrando a existência de contas na Suíça. “Eu não acredito que ele se safe dessa. A cassação é voto aberto, não é secreto mais”, disse Bolsonaro.
Ele ressalva, contudo, que não fará pré-julgamentos. Mas não poupa o PT, nem a presidente Dilma Rousseff. “A culpa é da Dilma. A corrupção aqui era projeto de poder.” Defensor dos militares, chamou de “doentes mentais” os esquerdistas que pegaram em armas para combater a ditadura. Pré-candidato a presidente em 2018 — provavelmente, pelo PSC —, Bolsonaro rejeita a volta dos militares. Na quinta pela manhã, ele recebeu a equipe do Correio no gabinete do filho, Eduardo, também deputado federal. Nos dois recintos, localizados um ao lado do outro, trabalhavam naquele momento cerca de 15 funcionários — apenas uma mulher, apesar de o parlamentar dizer que não tem problemas em contratar servidoras. A seguir os principais trechos da entrevista, com parte das contradições e da intolerância de Bolsonaro:
Como o senhor avalia a situação do presidente Eduardo Cunha?
Complicadíssima. Lamento, votei nele.
Continuaria votando?
Entre ele e um petista, sim. Votaria no Fernandinho Beira-Mar. Porque sei que esse petista estaria alinhado ao Palácio do Planalto. Eu sei o que é sofrer na pele tendo um presidente da Câmara alinhado ao Planalto.
O senhor votará pelo afastamento dele?
Se (o caso) chegar ao plenário, você vai ver o meu voto. Pelas informações que tenho até agora, ele cometeu um crime passível de quebra de decoro. Não quero dar uma de petista. Não é tanto pelas mentiras, é o documental. Eu quero ver o processo. Sou o deputado mais processado nesta Casa e já fui prejulgado diversas vezes.
O seu partido foi um dos signatários da carta defendendo Cunha. O senhor concorda com a carta?
Eu não participo do meu partido. Se participasse, seria o 32º a responder pelo Petrolão no Supremo Tribunal Federal
Mas e o Cunha?
Não acredito que ele se safe dessa. A cassação é voto aberto, não é secreto. Não existe corrupto sem corruptor. Enquanto a Petrobras estava com as portas abertas, tudo o que interessava a Lula e a Dilma era aprovado aqui. Quem é mais criminoso, o mandante ou o corruptor? Todos têm que pagar, mas a pena para o corruptor tem de ser maior. A culpa é da Dilma Rousseff. A corrupção aqui era projeto de poder. Porque, enquanto eles estavam aprovando o que bem entendiam, o governo ia implementando as suas políticas.
O senhor acha que os mi litares devem tomar o poder?
Não. Negativo. Não falo por eles, mas não devem e não querem. Qual é a base legal para tomar o poder?
Há gente defendendo o golpe. O que o senhor diz para essas pessoas?
Liberdade de expressão, mas não estão fazendo a coisa certa. Eles vêm aqui e conversam comigo. Querem que eu tire foto defendendo a intervenção, aí eu digo não. Nós temos muitas chances de chegar ao poder pelo voto.
O senhor está falando da candidatura do senhor?
Ter passado pela carreira militar não é crime, você não pode vetar, mas temos bons nomes para 2018.
O do senhor?
Em 2018, pretendo estar numa legenda em que a candidatura a presidente não seja negociada como foi no ano passado pelo meu partido.
Qual seria a legenda?
Estou namorando PSC. Não pretendo disputar a cadeira de deputado federal. Seria reeleito tranquilamente.
Por quê?
Eu acho que eu estou enxugando gelo.
O senhor defende que mulher ganhe menos?
Dizer que eu falei isso é uma covardia. As mulheres ganham menos, como mostra o IBGE, tendo em vista mais um direito trabalhista: a licença gestante. Daí o empresariado prefere o homem. Ou às vezes fica com a mulher com um salário diferenciado.
E isso está certo?
No serviço público, não existe. Mas pergunte para o empresariado.
Qual é a sua opinião?
Para mim, é por competência. Tem mulher que é competentíssima.
Quando o senhor fala que a realidade do país é essa, fica implícito que o seu discurso é o do empresariado.
Eu falei de acordo com as pesquisas. Para mim, tanto faz empregar uma mulher. Eu não estou preocupado em competir no mercado de trabalho.
O ministro Barroso, do Supremo Tribunal Federal, disse que as pessoas que defendem a redução da maioridade deveriam apresentar números e o custo para a sociedade.
As cadeias são maravilhosas no Brasil.
Maravilhosas?
São. A cadeia tira de circulação o marginal. Você precisa esperar ter um corpo no chão para punir com rigor? Os Estados Unidos têm a maior população carcerária do mundo. Agora, o número de mortes violentas por 100 mil habitantes é de três. Aqui no Brasil, em torno de 27. Você tem que tirar o elemento de circulação. Nos Estados Unidos, cada estado tem o seu código penal, cada estado diz se tem pena de morte ou não. Aqui, não. Aqui o Código Penal é nacional. Há estados lá que têm a lei dos três crimes. O elemento comete um furto e dois roubos, por exemplo, e começa com 25 anos de cadeia. E lá praticamente inexiste a figura da progressão. Nós, como seres humanos, só tememos o que respeitamos. O elemento hoje em dia sabe que, ao praticar um furto, não vai faltar gente para defendê-lo. O cara continua na rua. Até que no décimo furto ele passa para um latrocínio, porque ele está armado.
Por que ele está armado?
Porque o Estatuto do Desarmamento desarmou apenas o cidadão de bem e não o bandido.
Um segurança do senhor teve a arma roubada?
Não. É um subtenente da PM do Rio que trabalha com um filho meu (Flávio Bolsonaro, deputado estadual). Ele foi rendido na região da Cidade de Deus, levado para dentro da favela e só não morreu porque falou que trabalhava com o deputado Marcelo Freixo, do PSol, que entra em qualquer comunidade do Rio de Janeiro sem ser importunado.
Um dos argumentos de quem defende o atual Estatuto do Desarmamento é que as armas que vão para criminosos são legais, roubadas de policiais, militares e do cidadão de bem. Esse caso confirma a tese.
Eu tenho armas e vou continuar tendo armas, está ok? (neste trecho, ele passa a palavra ao filho, Eduardo Bolsonaro, também deputado federal).
A entrevista é com o senhor, deputado.
Sim, 10 segundinhos, fala aí, ele tem os números. (A partir daqui, Eduardo Bolsonaro fala de uma suposta pesquisa que indicaria que as armas legais nas mãos do crime representam menos de 3%. O deputado Jair Bolsonaro continua). Mas é a mesma coisa que uma pessoa roubar um carro e cometer um crime. Vamos proibir a venda de carros?
O que o senhor acha do projeto do senador José Serra que não muda o ECA, mas aumenta o prazo de internação?
Não, hoje apenas em casos que dão repercussão nacional o elemento cumpre três anos. A cada período não superior a seis meses, o menor vai em juízo e, caso tenha bom comportamento, dificilmente não vai para a rua. O aumento do prazo teria efeito apenas psicológico. Esses menores sabem muito bem o que estão fazendo.
A Justiça brasileira condena basicamente os mais pobres.
Lógico, é quem tem menos recurso e não consegue usar todas as chincanas jurídicas. É lógico que está errado. Eu sei que a corrupção mata mais do que um cara com um fuzil na mão. Eu defendo a revogação do Estatuto do Desarmamento. Quem quiser — lógico que atendendo os pré-requisitos — ter uma arma dentro da sua casa, pode defender não apenas o seu patrimônio, mas a integridade da sua família. Hoje, o marginal não se contenta em entrar na casa de alguém e roubar, amordaçar e ir embora, ele quer fazer uma barbaridade.
O Supremo decidiu que a união entre pessoas do mesmo sexo é constitucional. Por que lutar por um estatuto da família que, segundo o próprio STF, é inconstitucional? Não é gastar dinheiro público fazendo discurso para a plateia?
A nossa Constituição tem artigos que eu detesto, que podem ser melhorados. Agora, para nós vivermos em harmonia, temos que seguir naquela cartilha, assim como um evangélico quando vai para a igreja tem um livro preto, que é a Bíblia. Na Constituição, um dos artigos fala sobre a união estável e é bem claro: homem e mulher. No meu entender, o Supremo extrapolou.
Mas decidiu.
Mas não está certo, o Supremo está extrapolando.
O senhor acha que a homofobia tem que ser crime?
Por que não “porcofobia”, por que não “flamengofobia”? Se você quer defender que homossexualismo é uma questão natural, que a pessoa nasce assim, vamos respeitar os pedófilos, que também nasceram assim. No meu tempo, não existiam tantos gays. Hoje, é muito influenciado pela mídia. Quando você vê uma novela, geralmente o casal homossexual é mais inteligente, vive melhor, não tem traição. No subconsciente, vai influenciando e, em geral, as crianças.
O senhor tem, em seu gabinete, fotos dos presidentes militares e faz declarações favoráveis a regimes que menosprezam as liberdades democráticas. Ao mesmo tempo, é deputado eleito. Não há contradição nisso?
No período dos presidentes militares, as pessoas saíam às ruas, voltavam de madrugada e não eram assaltadas.
Mas muitas foram cassadas, torturadas, mortas.
Não generaliza. Hoje, muito mais pessoas, em números absolutos, são torturadas do que naquela época.
Mas as pessoas eram torturadas por defender a democracia.
Que pessoas foram torturadas?
Quando a sociedade muda o nome da ponte Costa e Silva para Honestino Guimarães, essa causa do senhor não perde o efeito?
O Parlamento não se preocupa com isso, isso é uma coisa de uma minoria de ativistas que gostaria que fosse inaugurado um novo porto, uma nova ponte no Brasil feita pelo PT. E que colocasse o nome dos ídolos deles. Se você tira as obras dos militares, o Brasil não existe. Só o Médici, o melhor presidente que já tivemos, construiu 15 hidrelétricas. Aniquilou a guerrilha do Araguaia.
Foi a época em que mais se torturou no Brasil.
Se você for hoje à Papuda, vai ver gente sendo torturada, o pessoal se vitimiza.
Estamos falando de presos políticos.
Que presos políticos? Eles estavam no foquismo. Eles queriam fazer o que Fidel Castro fez em 1959, na Serra Maestra. Esses caras são doentes mentais.
O senhor acha que as pessoas que se opuseram à ditadura são doentes mentais?
Pelas armas, sim.
A presidente Dilma Rousseff, inclusive?
É lógico. Por que ela não fala do passado dela? Ela se orgulha do seu passado? Fala do seu passado com o Cláudio Galeno, fala do seu passado com o Carlos Araújo. Ele disse que, com Dilma, participava de roubos de carga na Baixada Fluminense, assaltos a bancos, pegava armas de quartéis.
O ministro da Defesa, Aldo Rebelo, é filiado ao Partido Comunista do Brasil. O que acha disso?
A Dilma jamais escolheria uma pessoa do meu perfil. Eu sempre me dou bem com a maioria dos parlamentares, exceto com uma meia dúzia que não dá para conversar. Com o Aldo Rebelo, eu sempre tive um bom contato, temos em comum torcer para o mesmo time, o Palmeiras. Eu nunca vi o Aldo massacrando essa questão de passado. Até onde eu sei, o Aldo respeita a Lei da Anistia.