Empresários ampliam doações e assumem lugar de suas empresas nas eleições

Aiuri Rebello e Leonardo Martins

Do UOL, em São Paulo

Rubens Ometto, da Cosan, é o maior doador nas eleições de 2018 até agora

Rubens Ometto, da Cosan, é o maior doador nas eleições de 2018 até agora

Os dez maiores doadores individuais às campanhas políticas nas eleições deste ano até o momento multiplicaram várias vezes suas doações pessoais em relação a eleições passadas. O incremento aconteceu após mudança na legislação eleitoral que, a partir das eleições de 2016, proibiu as contribuições por parte de empresas. Metade deles nunca havia feito uma doação pessoal pelo menos até as eleições passadas.

Dos dez, quatro não são ligados a grandes grupos empresariais que registraram doações oficiais vultosas em eleições recentes, quando a participação das empresas no financiamento não era proibido. Dos dez maiores doadores, dois são da mesma família e grupo empresarial (leia mais abaixo).

As empresas que mais contribuíram com campanhas políticas em 2014 estão vetando ou desaconselhando as doações neste ano por parte de seus dirigentes, donos ou acionistas (como a JBS, a Odebrecht e outras envolvidas na Operação Lava Jato). Mas diversas outras empresas que tradicionalmente contribuem com campanhas políticas não aplicaram essa regra. Em 2014, a JBS sozinha doou quase meio bilhão de reais aos candidatos.

De acordo com dados divulgados pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) até a tarde desta sexta-feira (14), até agora os eleitores doaram R$ 170.896.219,42 às campanhas eleitorais. O maior doador individual nas eleições de 2018 até agora é Rubens Ometto Silveira Mello, com R$ 5,43 milhões doados a 40 candidatos, de vários partidos, da esquerda à direita, a maioria a deputado federal, e quatro diretórios partidários.

O prazo legal para a prestação da primeira parcial das contas de campanha terminou nesta quinta. O TSE Informa que possui até sábado (14) para atualizar a lista em seu site na internet.

Presidente do conselho de administração da Cosan, conglomerado de empresas que atua na área de gás, petróleo e distribuição de energia, entre outros segmentos da economia, Mello nunca havia feito uma doação eleitoral antes da mudança da legislação eleitoral, que proibiu a participação de pessoas jurídicas, de acordo com dados disponíveis no banco de dados do TSE sobre as eleições passadas. Sua primeira doação como pessoa física aconteceu em 2016, quando doou R$ 700 mil para algumas campanhas a prefeito e vereador.

Já a Cosan, empresa liderada por ele, doou R$ 6,8 milhões nas eleições de 2010 e outro R$ 1 milhão em 2012. Em 2014, as doações do conglomerado industrial pularam para R$ 30,8 milhões. No nome do empresário, há outras 20 firmas cadastradas na Receita Federal, onde ele consta como presidente, dono, sócio ou administrador. Elas não foram checadas nesta reportagem.

UOL procurou Mello, por meio de sua assessoria de imprensa, e perguntou se o incremento nas doações pessoais neste ano seriam uma estratégia para suprir, ao menos em parte, as doações que deixaram de ser feitas pelas empresas às quais é ligado. Em nota, ele diz que “as doações eleitorais foram realizadas em caráter pessoal e seguem as regras estabelecidas pelo TSE e demais normas aplicáveis”.

Empresário multiplica doações a partir de 2016

Qualquer pessoa física pode fazer doações pessoais registradas para campanhas políticas, desde que estas não ultrapassem 10% do rendimento bruto declarado pelo doador no ano anterior ao da eleição. Isso deve derrubar a quantidade de doações, já que para as contribuições empresariais não havia limite legal.

Em segundo lugar na lista de principais doadores deste ano está Rubens Menin Teixeira de Souza, presidente da empreiteira MRV Engenharia. Ele doou até agora R$ 2,21 milhões para campanhas, de acordo com os dados do TSE. Ele apoia 13 candidatos a deputado federal, deputado estadual e senador, além do diretório do DEM no Rio de Janeiro.

O empresário já havia feito doações eleitorais registradas oficialmente anteriormente, mas nunca havia gastado tanto do próprio bolso. Em 2016, ele doou R$ 1,5 milhão; em 2014, foram R$ 45 mil; em 2012, R$ 50 mil; e em 2010, R$ 120 mil.

A MRV, em contrapartida, doou R$ 4,7 milhões a campanhas políticas em 2014, R$ 3,4 milhões em 2012 e R$ 1,1 milhão em 2010.

Procurado pela reportagem para comentar suas doações eleitorais, por meio da assessoria de imprensa da MRV, Souza não respondeu.

Família Rocha, junta, fica em segundo no ranking de doações

Em terceiro lugar na lista de maiores doadores às campanhas políticas em 2018, está Nevaldo Rocha, pai do ex-presidenciável Flávio Rocha (PRB), que retirou a candidatura para seu partido apoiar Geraldo Alckmin (PSDB). Nevaldo doou sozinho até agora, para diversas campanhas, R$ 2,2 milhões.

Paulo Liebert/Folhapress

O empresário Nevaldo Rocha, dono da Riachuelo

Ao todo, R$ 2 milhões foram para o candidato a deputado federal Gabriel Rocha Kanner (PRB-SP), o candidato da família (ele é sobrinho de Flávio Rocha). O restante foi para o candidato a deputado estadual Rogério Simonetti Marinho (PSDB-RN). Ele nunca havia feito uma doação eleitoral como pessoa física.

Com as doações de R$ 1,232 milhão de Lisiane Gurgel Rocha e de R$ 862.500 de Elvio Gurgel Rocha — filhos de Nevaldo e irmãos de Flávio — juntos os três membros da família doaram R$ 4,294 milhões, o maior volume de recursos investido por uma mesma família até agora. Lisiane está em oitavo lugar na lista de maiores doadores na lista do TSE, e Elvio, em décimo primeiro. Ambos começaram a doar pessoalmente em 2016, quando contribuíram com algumas campanhas com R$ 50 mil cada um.

Os Rochas são controladores da rede de lojas de varejo Riachuelo e indústrias têxteis, entre outros negócios. Em eleições passadas, empresas da família também contribuíam com campanhas políticas com doações oficiais. Porém, o valor não alcançava o que está sendo doado neste ano.

A família, por meio de suas empresas, doou R$ 555.730 a campanhas em 2014, R$ 60 mil em 2012 e R$ 340 mil em 2010.

Procurados pela reportagem, Nevaldo, Lisiane e Elvio disseram entender que devem participar do processo eleitoral, com o intuito de fortalecer a democracia brasileira. “A possibilidade de doações de pessoas físicas para campanhas eleitorais é um direito de todos os cidadãos brasileiros”, afirma a nota enviada pela família Rocha. “As doações de pessoas jurídicas foram proibidas por decisão do Supremo Tribunal Federal. Nevaldo, Lisiane e Elvio respeitam a legislação vigente e dão plena transparência às doações realizadas”, acrescenta a resposta.

Empresário diz que vai doar mais ainda

Outro grande doador eleitoral que aparece no ranking do TSE este ano é o advogado Felipe Sarmento Cordeiro, ligado a um tradicional escritório de advocacia com atuação em Brasília, dentre outras praças. O advogado doou para campanhas pela primeira vez na vida um valor de R$ 2 milhões — tudo para o diretório do MDB no Distrito Federal — e aparece em quarto lugar na lista do TSE. Anteriormente, uma das empresas registradas em seu nome havia doado apenas R$ 10 mil a campanhas, nas eleições de 2010.

A reportagem procurou o advogado para comentar as doações, mas até agora não obteve retorno.

O dono da locadora de veículos Localiza Hertz, José Salim Mattar Júnior, também figura na lista dos dez maiores doadores eleitorais deste ano até o momento, na quinta posição. Ele contribuiu com R$ 1,850 milhão de seu dinheiro pessoal para 17 candidatos de todo o país. Ele é doador eleitoral pelo menos desde 2010, quando contribuiu com uma doação de R$ 500. Em 2012, ele doou menos ainda, R$ 200. Em 2014, o valor saltou para R$ 1,75 milhão e, em 2016, contribuiu com R$ 370 mil a diversas campanhas.

No passado, antes que as doações empresariais fossem proibidas, ele já contribuía por meio de sua locadora. Curiosamente, porém, os valores sempre foram muito mais baixos que as doações pessoais. Em 2014, foram R$ 2 mil em doações empresariais; em 2012 o valor registrado ficou em R$ 5.400; e, em 2010, apenas R$ 20.

“A situação do país hoje é mais crítica do que no passado”, afirma o empresário. “A classe empresarial precisa estar mais presente na política. No passado, os empresários ficaram tomando conta de seus negócios e delegaram a política para os políticos, e estes demonstraram não estar aptos a cuidar do Estado, do orçamento e das atribuições que deveriam competir ao Estado, como prover saúde de qualidade, educação em padrões mais elevados e segurança aos cidadãos. Os políticos falharam em seu papel de gestores da coisa pública.”

Sobre doações de suas empresas a políticos no passado, o dono da Localiza diz que “uma empresa cidadã, que não depende e nem mantém relações incestuosas com o governo e que conduz os seus negócios em elevados padrões éticos, deve contribuir para eleger melhores candidatos que possam cuidar melhor da coisa pública.” Ele afirma que vai doar mais dinheiro neste ano, com o objetivo de fazer a parte dele e combater as candidaturas do espectro político de esquerda.

Parentes de políticos integram a lista

Em sexto na lista de doadores do TSE, aparece Carlos Francisco Ribeiro Jereissati, integrante da família do senador tucano Tasso Jereissati, do Ceará. Ele doou R$ 1,75 milhão do próprio bolso para oito candidatos até agora neste ano, o que faz dele o quarto maior doador individual até o momento.

Em 2016, primeiro ano com doações oficiais registradas no nome do empresário, ele repassou R$ 180 mil a campanhas políticas. Empresas de Jereissati — ele e sua família fazem parte do grupo controlador do Shopping Iguatemi, em São Paulo, dentre outros negócios — eram tradicionais colaboradoras de campanhas políticas até 2014, antes deste tipo de apoio ser proibido. Jereissati também é acionista da operadora de telefonia Oi.

Na última eleição presidencial, empresas dele doaram ao menos R$ 6,25 milhões. No pleito de 2012, foram apenas R$ 50 mil doados e, em 2010, R$ 700 mil destinados a campanhas políticas. Como o conglomerado da família envolve dezenas de empresas, das quais várias não foram checadas nesta reportagem, o valor pode ser maior.

A reportagem não conseguiu falar com Jereissati sobre as doações dele e de suas empresas.

Nem todos doadores são ligados a empresas que contribuíam

Os sétimo, nono e décimo colocados do ranking de maiores doadores na primeira prestação de contas parcial do TSE, respectivamente Natasha Preza Sachetti, Inácio José Webler e José Carlos Reis de Magalhães Neto, não foram relacionados a nenhum grupo empresarial que tradicionalmente doa para campanhas em eleições recentes, na apuração da reportagem do UOL.

Em 2016, Natasha já havia doado R$ 50 mil a campanhas e, em 2014, R$ 365 mil. Neste ano contribuiu com R$ 1,382 milhões até agora. Ela é sobrinha do candidato a senador Adilton Domingos Sachetti (PRB-MT), atualmente deputado federal, a quem apoia junto a outros dez candidatos (um a deputado federal e nove a deputado estadual). O UOL não localizou nenhum contato ou representante da doadora de campanha para comentar as doações.

Já Webler é ligado ao agronegócio, e, nas últimas três eleições, fez doações pessoais modestas a campanhas políticas. Filiado ao DEM em Mato Grosso, doou R$ 15 mil em 2016, R$ 88 mil em 2014 e, em 2012, R$ 6.244. Neste ano, já doou R$ 1 milhão à direção estadual do PRB em Mato Grosso. A reportagem não localizou doações eleitorais das empresas dele e nem conseguiu falar com o próprio sobre o assunto.

Fecha a lista de maiores doadores das eleições em 2018 até o momento, em décimo lugar, o investidor Magalhães Neto, que atua principalmente no mercado financeiro e é dono ou sócio de diversas empresas. A principal delas é o bilionário fundo de investimento Tarpon. Ele já gastou R$ 950 mil com as eleições deste ano. Investiu em dez candidatos de diversos estados, a maior parte a deputado federal.

Repetindo o padrão da maioria dos empresários nesta reportagem, ele fez doações políticas pessoais modestas em eleições passadas: R$ 25 mil, em 2014, e R$ 12,5 mil, em 2010. A reportagem não localizou doações de suas empresas em eleições passadas. Ele não foi localizado para comentar a reportagem.

O cruzamento dos dados das doações eleitorais em pleitos anteriores com as deste ano, assim como as empresas relacionadas às pessoas físicas, foi feito com dados da Receita Federal, do TSE e com a ajuda da plataforma “Cruza Dados”, desenvolvida pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) para uso de jornalistas.

* Após a publicação, a reportagem foi atualizada de acordo com o que o TSE havia divulgado até às 17h desta terça-feira (14).

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