Por Cláudia Santa Rosa *
A crise decorrente da propagação da Covid -19 instalou-se, no último mês, em escala de pandemia. Há pouco mais de uma semana, as autoridades brasileiras, de maneira sensata, vêm adotando um protocolo que impõe isolamento social à população com um objetivo claro: diminuir o número de pessoas infectadas.
Ainda não se sabe o tempo que crianças e jovens ficarão distantes das escolas. Caso a suspensão das atividades letivas se estendam por semanas ou meses, a frágil educação básica pública, que é ofertada a 85% da população, sofrerá, indiscutivelmente, mais um tombo no sonho da qualidade, isso sem falar nas consequências para milhares de crianças e adolescentes que precisam do apoio nutricional e social encontrado nas instituições de ensino.
Trabalho em uma escola estadual que oferta os anos iniciais do ensino fundamental. Tão logo as aulas foram suspensas, iniciamos um trabalho de mediação pedagógica por grupos de WhatsApp, atingindo 97% das crianças. Com o horário das aulas definido, seguindo um planejamento e em sintonia com as famílias, recorremos à tecnologia mais acessível ao público de baixa renda: o smartphone. Deu certo!
A divulgação nas redes sociais do trabalho da Escola Estadual de Tempo Integral Dr. Manoel Dantas gerou repercussão em alguns portais de notícias, blogs, rádio e TVs do Rio Grande do Norte. Muitos professores passaram a interagir comigo sobre o tema e alguns relataram práticas semelhantes, mas com algumas dificuldades: problemas de famílias que dispõem do telefone celular, mas sem o acesso à internet; problemas daquelas que têm, mas a memória do aparelho ou o pacote de dados não suporta rodar vídeos, baixar documentos e etc. Que desafio! Um terceiro grupo me tocou, sensivelmente: crianças e jovens que residem em áreas onde não há acesso, sequer, ao sinal do celular, imagine ter sinal de internet. O que fazer?
Percebi que tudo que li e ouvi até o momento sobre soluções para a continuidade dos estudos, em tempos de pandemia, parecem centradas, apenas, pela via da internet, inacessível para muitos, portanto, são soluções excludentes.
Como não é papel de uma escola ou de uma pequena equipe, tampouco de uma professora garantir a solução de problemas que transcendem suas competências, restrinjo-me a indagar: por que o Estado brasileiro não utiliza a TV, o rádio e a internet para fazer a “escola” continuar? Por que centrar as atenções apenas na internet?
Os canais de TVs públicas e comerciais podiam abrir espaços em suas grades para a transmissão de conteúdos do currículo escolar. Para o ensino médio, por exemplo, há muito material produzido, inclusive por grupos de comunicação e por TVs educativas, que poderia ser reprisado. Há também video-aulas decorrentes de projetos de secretarias de educação de algumas unidades da federação que poderiam ser exibidos. Isso é o ideal? Não, mas pode ser melhor do que nada.
Adotados os mesmos cuidados destinados aos profissionais da área de saúde, equipes de professores poderiam ser acionadas para produzirem teleaulas e não penso que seriam por ano ou série, mas por blocos de habilidades, priorizando conteúdos essenciais. As rádios também podem exercer o mesmo papel. Indiscutivelmente, os sinais de TVs e rádios chegam a lugares a que a internet ainda levará muito tempo.
Pensemos de forma ampliada: não é raro verificarmos que as residências mais simples, por exemplo, da zona rural do nordeste brasileiro podem até não dispor de uma geladeira, mas o rádio e a televisão com a antena parabólica parecem ser um kit de primeira necessidade.
Talvez tenha chegado o momento de aprendermos com a experiência de sucesso que foi o projeto de alfabetização pelo rádio, implantado, no Brasil, logo após a Segunda Guerra Mundial, e que teve como público-alvo as populações da zona rural.
Tudo isso para refletirmos: só a internet é suficiente? Não. Outras soluções são, portanto, necessárias e possíveis.
* Professora, pós-graduada em Educação e ex-secretária de Educação e Cultura do RN