Arquivo diários:31/07/2019

Falas de Bolsonaro causam preocupação no Planalto

Em reunião de emergência, auxiliares avaliam diminuir a exposição de presidente
Renata Agostini, Mateus Vargas e Julia Lindner

 

A sequência de declarações de Jair Bolsonaro nos últimos dias levou apreensão a alguns de seus auxiliares mais próximos e motivou uma reunião de emergência no Palácio do Planalto na manhã desta terça-feira, 30. Na avaliação do grupo, que inclui integrantes da ala militar do governo, o presidente elevou em demasia o tom de suas falas, o que vem prejudicando sua gestão.

Enquanto ele provoca dando declarações desencontradas sobre a morte do pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, na ditadura militar, põe em dúvida relato de indígenas acerca de ataque de garimpeiros no Amapá e evita lamentar o massacre em Altamira, o governo perde a chance de divulgar pautas positivas, de acordo com integrantes desse grupo.

O presidente da República, Jair Bolsonaro
O presidente da República, Jair Bolsonaro
Foto: Adriano Machado / Reuters
Nesta terça, Bolsonaro voltou a causar polêmica ao questionar a veracidade de documentos oficiais que apontam a morte de Fernando de Santa Cruz, pai de Felipe, como vítima da ditadura. “A questão de 1964, não existem documentos se matou, não matou, isso aí é balela”, disse.

De acordo com uma fonte a par da conversa, “coisas boas”, como a liberação do FGTS ou a descoberta do hacker que invadiu o celular de autoridades, acabam “se perdendo em polêmicas” logo depois diante do “destempero” presidencial.

Uma das razões da reunião foi justamente tentar entender o que está por trás do comportamento de Bolsonaro. Muitos deles admitem que têm sido pegos de surpresa pelas declarações controversas do presidente.

Dois diagnósticos foram feitos. O primeiro é que a equipe presidencial errou ao deixar Bolsonaro muito exposto a jornalistas durante eventos nos últimos dias. A intenção é reduzir parte das interações, limitando, assim, as oportunidades de ele alimentar novas polêmicas.

A segunda avaliação é de que integrantes da chamada ala ideológica têm conseguido influenciar o presidente de forma mais assertiva. Não está claro para o grupo quem são os mais “ativos” nessa empreitada, embora “suspeitas” recaiam sobre aliados encarregados de sua comunicação digital, área de influência de Carlos Bolsonaro.

Uma das leituras feitas é de que essa tentativa de inflamar o discurso do presidente decorre de uma reação à chegada ao Planalto de assessores batizados internamente de “agentes contemporizadores”: Jorge Oliveira, ministro da Secretaria-Geral da Presidência; Fabio Wajngarten, chefe da Secretaria de Comunicação; e o general Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo.

O trio adota discurso moderado e tenta fazer pontes com a imprensa. Ramos tem histórico de bom relacionamento com jornalistas e Wajngarten teve encontro recente com a cúpula das Organizações Globo.

Um auxiliar presidencial lembra que, apesar do aparente “arroubo”, as declarações feitas por Bolsonaro constam de seu repertório. O ex-deputado é conhecido por defender o período militar e a tortura contra militantes de esquerda.

Segundo alguns destes aliados, Bolsonaro moderou o tom durante semanas cruciais para a tramitação da reforma da Previdência justamente atendendo a pedido de aliados. Durante o recesso parlamentar, no entanto, ele voltou às polêmicas.

Além de “blindar” Bolsonaro do contato com a imprensa, o grupo acredita que o retorno do filho mais velho ao Brasil, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), possa ajudar a amainar os ânimos. Ele tem um perfil mais moderado em relação aos irmãos e já foi comunicado sobre a crise.

Repercussão

Além de ofuscar feitos do governo, a nova crise alarmou ministros pelo potencial de desgaste na imagem do presidente. Desde o anúncio sobre a indicação de Eduardo Bolsonaro à embaixada do Brasil nos Estados Unidos, a militância pró-governo tem encontrado dificuldade para reverter aumento de menções negativas nas redes sociais de Bolsonaro, avaliou Sergio Denicoli, diretor da AP/Exata, especializada em monitoramente das redes.

A repercussão negativa sobre a fala que trata da morte do pai do presidente da OAB entrará no terceiro dia consecutivo, segundo análise. “A própria militância dele não conseguiu defender o que foi dito, mas defende a sinceridade do presidente”, disse Denicoli.

Apesar de o aumento dos dias de crises, o diretor da empresa afirmou que Bolsonaro ainda tem ampla maioria de apoiadores nas redes sociais. “Está longe de perder a popularidade.” / COLABOROU MARIANA HAUBERT

Bolsonaro tem “rompantes autoritários” e “incontinência verbal

Ex-presidente da República afirmou que declarações de Bolsonaro afetam a credibilidade do Brasil

Gregory Prudenciano

O ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso escreveu em sua conta no Twitter que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) tem dado “vazão a rompantes autoritários” em suas declarações recentes a respeito da morte de Fernando Santa Cruz, pai do presidente da Organização dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, durante a ditadura militar.

Fernando Henrique Cardoso (FHC) durante entrevista IFHC em São Paulo
Fernando Henrique Cardoso (FHC) durante entrevista IFHC em São Paulo
Foto: Gabriela Biló / Estadão Conteúdo
Para FHC, Bolsonaro tem “incontinência verbal”, o que traz, na visão do tucano, prejuízos para o Brasil porque afeta a credibilidade do País.

“O presidente despreza os limites do bom senso por sua incontinência verbal. Contraria documentos oficiais sobre o pai do presidente da OAB e dá vazão a rompantes autoritários. Prejuízo para ele e para o Brasil: gostemos ou não, foi eleito. O que diz repercute e afeta a nossa credibilidade”, tuitou o ex-presidente.

Estadão

Caixa anuncia redução de até 40% nos juros do cheque especial

Os clientes da Caixa Econômica Federal pagarão menos juros nas principais linhas de crédito e terão acesso a um pacote de serviços com taxas mais baixas. A redução valerá tanto para pessoas físicas como para empresas.

A taxa máxima do cheque especial passará de 13,45% ao mês (pessoa física) e 14,95% ao mês (empresas) para 9,99% para os dois tipos de clientes. Os correntistas que aderirem a um novo pacote de serviços, o Caixa Sim, pagarão juros ainda menores para o cheque especial: 8,99% ao mês.

Para os clientes do pacote Caixa Sim, a redução dos juros do cheque especial chegará a 40% para empresas e 33% para pessoas físicas. Disponível tanto para pessoas físicas como para empresas, o novo pacote de serviços estará disponível a partir de 19 de agosto e custará R$ 25 por mês. A tarifa poderá ser convertida em bônus para linhas de celular

BC baixa juros para 6% ao ano, menor nível histórico, e indica mais cortes

O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central decidiu baixar a taxa básica de juros (Selic) em 0,5 ponto percentual, de 6,5% para 6% ao ano. Com isso, a Selic atinge uma nova mínima histórica (o Copom foi criado em 1996) e a poupança continua rendendo menos. A decisão foi unânime.

Esse foi o primeiro corte após dez reuniões de manutenção da Selic. Em seu comunicado, o comitê do BC indicou que pode fazer novos cortes nas próximas reuniões, ao afirmar que “a consolidação do cenário benigno para a inflação prospectiva deverá permitir ajuste adicional no grau de estímulo”.

Também nesta quarta, o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) cortou a taxa de juros pela primeira vez em 11 anos, desde a crise financeira de 2008. O corte foi de 0,25 ponto percentual, levando as taxas à faixa de 2% a 2,25%.

Dez reuniões sem mudança

Em outubro de 2016, o BC deu início a uma sequência de 12 cortes na Selic. Neste período, a taxa de juros caiu de 14,25% ao ano para 6,5% ano. Desde maio de 2018 até a última reunião, em junho, a taxa foi mantida no mesmo patamar. Foram dez encontros do Copom sem mudanças na Selic.

Juros ao consumidor são mais altos

A Selic é a taxa básica da economia e serve de referência para outras taxas de juros (financiamentos) e para remunerar investimentos corrigidos por ela. A Selic não representa exatamente os juros cobrados dos consumidores, que são muito mais altos.

Segundo os últimos dados divulgados pelo BC, a taxa de juros média do cheque especial subiu em junho para 322,2% ao ano. Os juros do rotativo do cartão de crédito ficaram em 300,1% ao ano, em média.

Petrobras eleva preço da gasolina e diesel em quase 4%

A Petrobras anunciou reajuste no preço dos combustíveis. No caso da gasolina, o aumento médio nas refinarias será de 3,99% a partir de amanhã (quinta-feira). O preço médio passou de R$ 1,6457 para R$ 1,7115. É a primeira alta desde o fim de abril.

No caso do diesel, a estatal anunciou avanço médio de 3,74% no preço do litro vendido à refinaria. Segundo a Petrobras, o valor médio subiu de R$ 2,0205 para R$ 2,0962. É a primeira lata desde o início de maio.

Os reajustes nos preços dos combustíveis pela Petrobras são alinhados aos valores do preço do barril do petróleo no mercado internacional e do câmbio. O repasse dos ajustes nas refinarias para os consumidores finais nos postos de combustíveis dependerá de diversos fatores, como tributos, margens de distribuição e revenda, e mistura obrigatória de biodiesel em ambos os combustíveis.

Extra

Transformação digital: Prefeitura de São Gonçalo vai lançar aplicativo de ofertas de emprego no município

São Gonçalo do Amarante/RN está entrando firme no conceito de cidade inteligente, o ‘smart city’. Após se consolidar como a segunda cidade do Brasil a receber um empreendimento com esse conceito, a Prefeitura Municipal está adotando tecnologias móveis para conectar o cidadão aos mais diversos serviços públicos.

Está sendo desenvolvido um aplicativo para facilitar a busca por vagas de emprego. Intitulado como ‘Quero Trabalhar’, o ‘app’ tem como finalidade cadastrar ofertas de empregos geradas pelos empreendimentos que estão chegando na cidade, como também o currículo e informações do cidadão que estão buscando uma vaga. Após o cadastro as informações serão cruzadas e informadas ao usuário e empregador.

“Usando inteligência artificial para cruzar dados, o aplicativo vai ajudar na interação entre a empresa e o candidato. É muito parecido com o “tinder”, os interesses são conectados facilitando a comunicação entre as partes interessadas. Estamos usando a tecnologia para melhorar nossos índices de geração de emprego”, observa o prefeito.

O secretário municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo, Vagner Araújo, destaca que o aplicativo só permite o cadastro de pessoas que moram no município. “O objetivo é gerar empregos para a população da nossa cidade. Se deixássemos aberto, poderíamos estar intensificando a concorrência, que já existe hoje. Por estarmos recebendo muitos investimentos, graças às nossas politicas de atração de empresa, pessoas de diferentes cidades da Grande Natal têm buscado trabalho em São Gonçalo”, observa.

Surpresos, aliados e militares tentam identificar foco de ações intempestivas de Bolsonaro

Aliados de Jair Bolsonaro (PSL) e militares tentam identificar o foco das ações intempestivas do presidente.

A avaliação do núcleo militar e de integrantes da base do governo no Congresso é a de que, principalmente nos últimos dias, Bolsonaro voltou a ser estimulado a ir para o confronto e a dar vazão ao que é classificado como pauta secundária.

A preocupação desses aliados é a de que, ao ser incentivado a prestar atenção em temas laterais, Bolsonaro acaba, inevitavelmente, esquecendo a agenda positiva do governo, como a econômica —que tem apoio da Câmara e do Senado e respaldo de setores da população.

Tanto os militares quanto integrantes da Secretaria de Comunicação do Palácio do Planalto foram pegos de surpresa com as declarações de Bolsonaro, dadas na porta do Palácio da Alvorada, sobre o pai do presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

A entrevista à imprensa não estava programada na agenda e os auxiliares do presidente já o aguardavam na antessala de seu gabinete para um reunião programada para as 8h10. Àquele momento, Bolsonaro estava acompanhado apenas de seguranças e ajudantes de ordem.

O núcleo duro do Planalto, incluindo civis e militares, e os aliados mais próximos do Congresso, como o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), participaram, só depois da entrevista, do encontro que já foi incorporado à rotina diária de Bolsonaro.

A reunião, que começou atrasada por causa das declarações matutinas do presidente, teve uma pauta que passou ao largo das declarações polêmicas que Bolsonaro acabara de dar na saída do Alvorada.

De acordo com relatos ouvidos pela Folha, não foi proposital —os auxiliares palacianos e os aliados nem tiveram tempo de ver as falas.

“Por que a OAB impediu que a Polícia Federal entrasse no telefone de uma dos caríssimos advogados? Qual a intenção da OAB? Quem é essa OAB? Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto pra ele”, afirmara Bolsonaro, reclamando da atuação da Ordem na investigação do caso Adélio Bispo, autor do atentado à faca do qual foi alvo.

Ao ironizar o desaparecimento do pai do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, durante a ditadura militar (1964-1985), Bolsonaro estimulou a organização de um gabinete de crise informal.

Nesta terça-feira (30), o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, foi escalado para tentar conter a onda de declarações extemporâneas do presidente.

A fala de como teria se dado a morte de Fernando Santa Cruz soou despropositada também entre os militares.

A avaliação recorrente, dentro e fora do Planalto, entre aliados e adversários do governo, é de que Bolsonaro extrapolou o limite do aceitável, ao “dar um golpe abaixo da linha da cintura” do presidente da OAB.

O impacto, dizem pessoas próximas a Bolsonaro, poderia ter sido muito maior se o Congresso não estivesse em recesso.

A preocupação, de acordo com a análise desses aliados, é que o governo perca, definitivamente, o controle da pauta positiva e que, diante de tantas polêmicas, até mesmo a base de sustentação de Bolsonaro nas ruas acabe o abandonando.

Como mostrou a Folha nesta terça, um dos fatores que levaram Bolsonaro a intensificar a agressividade no discurso foram as críticas à indicação de seu filho Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) como embaixador do Brasil nos EUA.

Em conversas reservadas, Bolsonaro disse a aliados que vê nos ataques a Eduardo uma ofensa pessoal e que, por isso, seria sua obrigação sair em defesa pública do filho.

De acordo com assessores palacianos, o presidente é bastante sensível a qualquer questão que atinja sua família e pouco escuta a equipe sobre o tom que adotará nas declarações.

Não se sabe, portanto, se o comportamento intempestivo do presidente é estimulado pelos filhos. Aliados lembram, no entanto, que o deputado Eduardo e o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) passaram grande parte do recesso parlamentar fora do país.

No Congresso, a percepção é a de que o presidente ainda é influenciado por uma rede que ainda não se desvinculou do espírito da campanha eleitoral.

O clima de caça às bruxas, dizem parlamentares mais próximos ao governo, segue na órbita de Bolsonaro e, em determinados momentos, como o atual, explode.

Na perspectiva de virar a pauta, palacianos marcaram um encontro de Bolsonaro com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), na manhã desta terça. O encontro serviu para distensionar a relação entre eles.

O esforço no Planalto agora é para, às vésperas da retomada dos trabalhos no Congresso, estancar a crise provocada pela série de declarações do presidente e preservar o avanço das reformas tributária e da Previdência.

“Apesar de Bolsonaro, temos que tratar das questões do Brasil. Não dá para a gente aprofundar a crise em que pesem essas maluquices”, disse o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM).

Nesta terça, no entanto, Bolsonaro voltou a falar do caso de Fernando Santa Cruz e disse não ter documentos que descrevam que ele desapareceu em 1974, após ser preso pelo DOI-Codi, órgão de repressão da ditadura.

“O que eu sei é o que falei para vocês. Não tem nada escrito que foi isso, foi aquilo. Meu sentimento era esse”, disse o presidente, em entrevista pela manhã.

Contestado com o fato de haver documentos públicos que mostram que o desaparecimento se deu após prisão pelo Estado, o presidente questionou a Comissão Nacional da Verdade (CNV), grupo criado pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em 2011 que investigou violações aos direitos humanos ocorridos durante o regime.

“Você acredita em Comissão da Verdade? Qual foi a composição da Comissão da Verdade? Foram sete pessoas indicadas por quem? Pela Dilma”, afirmou. “Nós queremos desvendar crimes. A questão de 64, não existem documentos de matou, não matou, isso aí é balela.”​

relatório final da CNV, divulgado em 2014, concluiu que 434 pessoas foram mortas ou desapareceram vítimas de violência do Estado no período que vai de 1946 a 1988. Dentre esses, há 210 desaparecidos e 191 mortos —33 corpos foram localizados.

FOLHAPRESS

Bolsonaro: ‘Sou assim mesmo, não tem estratégia, não vou mudar’

O presidente Jair Bolsonaro tem um recado claro: ele não vai mudar. A repercussão negativa, e até críticas de aliados, a suas declarações nos últimos dias, comataques a governadores do Nordeste e contestação de dados históricos da ditadura militar , estão longe de fazê-lo repensar o próprio comportamento. Em conversa exclusiva com O GLOBO, Bolsonaro confirma que continuará falando à parcela mais conservadora da população, a primeira a aderir à sua candidatura .

— Sou assim mesmo. Não tem estratégia. Se eu estivesse preocupado com 2022 não dava essas declarações — afirmou Bolsonaro, ao ser questionado se as falas recentes são planejadas ou apenas resultado de impulsividade.

O presidente recebeu a reportagem em seu gabinete no terceiro andar no Palácio do Planalto após a cerimônia em que lançou um amplo processo de flexibilização de segurança e saúde do Trabalho. Depois de uma curta entrevista coletiva com jornalistas, Bolsonaro estava subindo a rampa que liga o Salão Nobre ao seu gabinete quando foi abordado pela reportagem, que pediu uma conversa com ele. Imediatamente, sem ouvir seus auxiliares da área de comunicação, pediu que os seguranças liberassem a repórter para acompanhá-lo.

A conversa não pôde ser gravada. Na entrada do gabinete, os celulares tiveram que ficar guardados. Entretanto, Bolsonaro, que havia dito que não daria entrevista, emprestou a própria caneta Bic. Assim, suas declarações poderiam ser anotadas corretamente.

Como o encontro não estava previsto, a conversa, que durou 15 minutos, foi interrompida três vezes pelo ajudante de ordens para lembrá-lo que existiam outros dois compromissos à espera. Bolsonaro, mesmo com o alerta, deixou a conversa fluir e falou de vários assuntos, mesmo os incômodos. Afirmou que a imprensa o persegue, mas que não se importa mais.

— O dia que não apanho da imprensa eu até estranho — disse, rindo.

Hiperativo, o presidente revelou que acorda antes das 4h e começa disparar mensagens de WhatsApp a ministros e assessores. Alguns deles, contou, ganharam direito a toques especiais no celular: são os quatro ajudantes de ordens, que têm um alerta diferente para que Bolsonaro possa atendê-los o mais rapidamente possível.

Na defesa da exploração de áreas de garimpo pelo país, disse ter encomendado estudo ao ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, para criar “pequenas Serras Peladas” no Brasil, que poderiam ser exploradas tanto por grupos estrangeiros como por povos indígenas.

— Mas a fiscalização seria pesada. E índio também poderia explorar — promete.

Ao ser questionado a respeito de suas declarações sobre Fernando Santa Cruz, pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Bolsonaro voltou a se justificar, dizendo que a entidade atuou para que não se chegasse aos “mandantes da sua tentativa de assassinato”. Ele insiste que a quebra de sigilo telefônico de um advogado de Adélio Bispo de Oliveira daria um novo rumo à história. A medida não foi adotada por um recurso da Ordem. Bolsonaro disse que não recorreu da decisão da Justiça, que classificou seu agressor como inimputável porque, ao ser enquadrado como portador de Transtorno Delirante Persistente, Adélio estará agora em “prisão perpétua”.

— Porque eu ganharia (o recurso). Ele responderia por tentativa de homicídio. No máximo em dois anos estaria na rua. Agora, pela insanidade mental, é prisão perpétua.

Bolsonaro esquivou-se novamente de comentários aprofundados sobre o massacre no presídio de Altamira, no Pará, onde 58 detentos morreram, dos quais 16 foram decapitados, a maior carnificina em cadeias desde a registrada no Carandiru (SP) em 2001. Ele justificou que queria evitar “polêmica”.

— Já disse pela manhã na porta do Alvorada. Você estava lá? Pergunte às vítimas dos facínoras. Pergunte para elas o que acham, não vou criar polêmica — respondeu, confirmado com seus auxiliares o número total de vítimas.

O presidente disse que está conversando com grupos estrangeiros para transformar a Baía de Angra dos Reis, onde tem uma casa e chegou a ser multado no passado por pesca ilegal, no que ele vem chamando de “Cancún brasileira”. Segundo ele, empresários estão dispostos a investir “bilhões”, que gerariam empregos na região.

— Não vou dizer (quais são esses grupos). São conglomerados de países — afirmou, sinalizando, em seguida, que investidores de Emirados Árabes, Japão e Israel já teriam demonstrado interesse.

O desempenho no exterior de Eduardo Bolsonaro, seu filho deputado federal, é o assunto que mais o deixa, visivelmente, satisfeito. Para o presidente, cabe aos senadores aprovarem Eduardo como embaixador do Brasil nos Estados Unidos, mas ele está certo que o elogio feito ontem pelo presidente americano, Donald Trump, o ajudará a conquistar os votos.

— A decisão é do Senado. Acho que a declaração do Trump hoje ajuda — disse.

Bolsonaro confirmou que está em franca aproximação com o presidente da Bolívia, Evo Morales, como visto durante a Cúpula do Mercosul, em Santa Fé, na Argentina, há duas semanas. Disse que o mandatário boliviano sorriu para ele, o que não tinha acontecido nem mesmo quando esteve em sua posse em janeiro. Afirmou ainda que os dois países buscam aproximação e que Morales demonstrou interesse em comprar um avião KC-390 da Embraer.

Quem manda

Questionado se a mudança de Morales não demonstra um caráter pragmático, que se adapta de acordo com as circunstâncias, Bolsonaro defendeu o boliviano.

— Não. Como eu disse hoje, todo mundo evolui — conta Bolsonaro, que usou Morales como exemplo para defender a sua tese contra as reservas indígenas. — Se na Bolívia um índio pode ser presidente, por que aqui tem que ficar confinado em uma uma área?

Nos quase 15 minutos de conversa, Bolsonaro deixou claro que quem manda é ele. O presidente tem uma agenda hoje de manhã em Anápolis (GO). A reportagem questionou, então, se ele pararia, como já vez em outra ocasião, para almoçar com caminhoneiros em uma rodovia. Um assessor disse que não, mas Bolsonaro o interrompeu:

— Não está previsto, mas, se tiver algo, eu aviso e muda na hora — justificou, confirmando que dá trabalho à equipe que cuida de sua proteção, subordinada ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

Bolsonaro encerrou a conversa quando os participantes da próxima reunião, incluindo o ministro Jorge Oliveira (Secretaria-Geral), entraram no gabinete.

Secretário de Comunicação, Fábio Wajngarten pediu que fosse feita uma foto da conversa.

— Não precisa. Não vou constrangê-la — disse o presidente, recebendo de volta a caneta Bic emprestada à repórter.

O GLOBO