Nathan Lopes
Do UOL, em São Paulo
Ao menos 13 políticos próximos ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e ao senador José Serra (PSDB) receberam mais de R$ 2 milhões em caixa dois na eleição de 2010, segundo delatores.
De acordo com os depoimentos, em praticamente todos os casos, os políticos foram escolhidos em função de uma possível ajuda que poderiam dar em relação a interesses da empreiteira ou para estreitar laços com Serra e Alckmin.
Os dois tucanos são apontados, ao lado do senador mineiro Aécio Neves, como presidenciáveis do PSDB para a eleição do ano que vem.
Entre os citados, estão dois ex-presidentes da Assembleia de São Paulo, cinco ex-secretários dos governos Serra (2007-2010) ou Alckmin (2001-2006 e 2011 até hoje) e políticos próximos aos dois tucanos, que se alternam no comando do governo do Estado há 17 anos.
Todos os políticos que responderam ao UOL negaram irregularidades.
Em 2010, Serra deixava o Palácio dos Bandeirantes para disputar a Presidência da República e Alckmin tentava voltar a comandar o Estado. Apenas Alckmin foi bem sucedido.
O mais próximo dos delatores ao esquema era Carlos Alberto Paschoal, então diretor-superintendente da CNO (Construtora Norberto Odebrecht) em São Paulo.
Dos 13 mencionados, os delatores citaram claramente que três foram escolhidos em função da proximidade aos dois tucanos. São eles: Roberto Freire (PPS), aliado a Serra, e Edson Aparecido (PSDB) e José Aníbal (PSDB), aliados a Alckmin.
‘Núcleo duro’
Em sua delação, Paschoal disse que “o candidato Edson Aparecido fazia parte do núcleo duro do candidato a governador Geraldo Alckmin”.
Portanto, tinha possibilidades de, além de se eleger como deputado, ter alguma posição relevante durante o governo Alckmin
Carlos Alberto Paschoal, ex-diretor da Odebrecht
Aparecido e Aníbal foram candidatos a deputado federal em 2010. Ambos foram eleitos, com 184.403 e 170.957 votos, respectivamente.
Sobre Aníbal, o delator afirma que decidiu, por conta própria, fazer o pagamento em caixa dois “considerando que ele era do grupo que eu chamaria de núcleo duro do candidato Geraldo Alckmin e que teria relevância num provável governo Alckmin, com direito a alguma secretaria, o que de fato acabou ocorrendo”.
Alckmin foi eleito, em primeiro turno, na eleição de 2010 e voltou ao Palácio dos Bandeirantes após um intervalo de quatro anos. Em seu secretariado de 2011 estavam Aníbal, na pasta de Energia, e Aparecido, na de Desenvolvimento Urbano. De acordo com o delator, Aníbal e Aparecido receberam R$ 50 mil cada um em doações não contabilizadas.
Valores recebidos como caixa 2 em 2010, segundo delatores
- Aloysio Nunes Ferreira (PSDB): R$ 500 mil; senador
- Paulo Pereira da Silva (PDT): R$ 200 mil via Odebrecht e R$ 200 mil via Braskem; deputado federal
- Duarte Nogueira (PSDB): R$ 350 mil; deputado federal
- Rodrigo Garcia (DEM): R$ 200 mil; deputado federal
- Roberto Freire (PPS): R$ 200 mil; deputado federal
- Fernando Capez (PSDB): R$ 100 mil; deputado estadual
- Edson Aparecido (PSDB): R$ 50 mil; deputado federal
- José Aníbal (PSDB): R$ 50 mil; deputado federal
- Barros Munhoz (PSDB): R$ 50 mil; deputado estadual
- Campos Machado (PTB): R$ 50 mil; deputado estadual
- Arnaldo Jardim (PPS): R$ 50 mil; deputado federal
- Roberto Massafera (PSDB): R$ 30 mil; deputado estadual
- Ricardo Montoro (PSDB): R$ 30 mil; deputado federal
Em uma das secretarias de Alckmin também havia influência de Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força Sindical, então no PDT. Seu filho, Alexandre Pereira da Silva trabalhou em 2012, na Fundac (Fundação para o Desenvolvimento das Artes e da Comunicação), ligada à Secretaria de Emprego e Relações do Trabalho, cuja chefia foi indicada por Paulinho com vistas a um apoio a Alckmin na eleição de 2014, o que acabou se confirmando por meio do partido que criou, o Solidariedade.
Em 2010, candidato a deputado federal, Paulinho recebeu R$ 400 mil, via caixa dois, do grupo Odebrecht, de acordo com o delator Alexandrino Alencar, ex-executivo da empreiteira. O pagamento teria como contrapartida a solução de greves que atrapalhavam obras da empresa, como a da Hidrelétrica do Rio Madeira, em Rondônia. O político foi eleito com 267.208 votos.
Apesar de, na época, ter apoiado o candidato do PT, Aloizio Mercadante, Paulinho diz que tem uma relação muito boa e que é amigo de Alckmin, que saiu vitorioso do pleito.
Já Roberto Freire teve o apoio de Serra, que pediu a doação ao candidato a deputado federal pelo PPS, segundo Paschoal.
No acordo de colaboração, o delator aponta que o acerto era com o “interesse de manter acesso e boas relações com políticos e partidos políticos importantes”. Em sua primeira eleição concorrendo em São Paulo, Freire –cuja base política era Pernambuco até então– foi eleito com 121.471 votos. O aliado de Serra recebeu R$ 200 mil em caixa dois, de acordo com Paschoal.
Outros secretários
Secretários do governo Serra também receberam dinheiro da Odebrecht via caixa dois. Um deles é Aloysio Nunes Ferreira (PSDB), responsável pela Casa Civil na época e tido como braço direito do tucano.
“Aloysio tinha relevância no governo, no PSDB. Uma figura proeminente. Eu tinha uma certa simpatia por ele, por sua trajetória de guerrilheiro”, falou Paschoal sobre o candidato do PSDB ao Senado em 2010. Ele foi eleito com 11,1 milhões de votos.
Segundo o delator, como não tinha acesso ao governador, os trâmites eram feitos com Aloysio, o “segundo homem no Estado”. O secretário foi quem solicitou a doação, que foi de R$ 500 mil em caixa dois, mas não houve pedido de contrapartida, de acordo com Paschoal.
“Se dependesse de mim, eu ia fazer tudo oficial. Em termos conceituais, eu diria… o caixa 2 é uma opção que eles [políticos] preferem para não serem identificados com o grupo econômico que os está ajudando”, comentou o ex-diretor da Odebrecht.
Além de Aloysio, outro secretário de Serra foi Rodrigo Garcia (DEM), da pasta de Desburocratização. Garcia, que é próximo também de Gilberto Kassab (PSD), aliado de Serra, recebeu, em 2010, R$ 200 mil na eleição para deputado federal. Ele foi eleito com 226.073 votos.
“Era um candidato importante, relevante para a organização”, disse Paschoal. “Ele [Garcia] reclamou que o valor era pouco”, comentou.
Atual gestão
No segundo mandato de Alckmin, há outros secretários que receberam da Odebrecht. Além de Aparecido, que comandou a Casa Civil até o ano passado e é tido como uma dos principais aliados do governador, e Garcia –hoje na Habitação–, a lista traz: Arnaldo Jardim (PPS), da Agricultura; e Duarte Nogueira (PSDB), de Logística e Transportes, atual prefeito de Ribeirão Preto (SP).
Segundo Paschoal, ele tratou sobre a verba diretamente com Jardim, que recebeu R$ 50 mil para tentar uma vaga na Câmara Federal em 2010. Ele foi eleito com 140.641 votos.
Já Nogueira recebeu R$ 50 mil, em caixa dois, por ser “muito próximo ao grupo político de Aloísio Araújo”, conselheiro da Odebrecht, falecido em 2014, segundo Paschoal. Araújo teve encontros com Alckmin, segundo o delator.
Porém, houve um outro pagamento, de R$ 300 mil, também feito de forma irregular, de acordo com outro delator, Cláudio Melo Filho, ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht. De acordo com Melo, o deputado, uma das lideranças da bancada ruralista na Câmara em 2010, solicitou apoio financeiro para “alinhamento de sua plataforma política com os interesses da Odebrecht Agroindustrial”. Ele foi reeleito deputado federal em 2010 com 124.737 votos.
Outros aliados
Assim como Nogueira, outros dois nomes receberam doações em função da proximidade com o conselheiro da Odebrecht: Campos Machado (PTB) e Barros Munhoz (PSDB), ambos ligados a Alckmin. Cada um recebeu R$ 50 mil para disputar uma cadeira na Assembleia Legislativa de São Paulo em 2010.
“O Campos Machado estava entrando já pela quarta ou quinta legislatura, um deputado já com bastante cancha e próximo ao doutor Aloisio”, disse Paschoal. Machado, que foi candidato a vice de Alckmin nas campanhas para a Prefeitura de São Paulo em 2000 e 2008, foi reeleito com 214.519 votos.
Já Barros Munhoz era presidente da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) quando recebeu a doação, via caixa dois, da Odebrecht. Munhoz, que comandou a Casa entre 2009 e 2013, foi reeleito com 183.859 votos.
Outro ex-presidente da Alesp, entre 2015 e 2016, e aliado de Alckmin também foi mencionado por delatores da Odebrecht. Fernando Capez (PSDB) recebeu R$ 100 mil para a disputa pelo cargo de deputado estadual na eleição de 2010. “Essa doação me foi pleiteada através de uma ONG [C Tem Que Saber C Tem que Curar] da qual o candidato é patrono”, comentou Paschoal. Capez foi eleito com 214.592 votos.
Aliado de Serra, Ricardo Montoro (PSDB) foi secretário de Participação e Parceria da Prefeitura de São Paulo durante o governo de Kassab. Além disso, Montoro é tio de um dos diretores da Odebrecht, Felipe Montoro Gens, que pediu que avaliasse o que seria possível fazer por ele, segundo o delator Paschoal. Ele recebeu R$ 30 mil, em caixa dois, para disputar o cargo de deputado federal em 2010. Com 74.213 votos, ele não foi eleito.
Já o deputado estadual Roberto Massafera (PSDB) recebeu porque já era conhecido de Paschoal. “Ele está entre as pessoas que eu elegia que tem boa cabeça, boa índole. Uma pessoa que eu achava que valia a pena apoiar. Parece meio falso, mas tentar melhor o nível dos nossos políticos. Não era muito significativo o apoio, mas eram R$ 30 mil”. Ele foi reeleito com 81.380 votos.