Ainda impactada pelo susto com a repercussão nacional de seu nome, a advogada Sabrina Veras, 26, quer continuar atuando na vara de família —apesar do episódio vivido em audiência no Ceará.
No último dia 21 de fevereiro, ela ligou o gravador de seu celular na 2ª Vara de Família de Fortaleza —segundo ela conta, ao perceber que o clima estava tenso.
No áudio, de nove minutos, divulgado pela seção da OAB no Ceará, o juiz Joaquim Solon Mota Junior chama Veras de desqualificada, imatura e ingênua e afirma que ela se “queimou com ele e com tantos quanto ele fale a história”.
Mota Junior questionava a advogada sobre a possibilidade de ela ter dito no fórum que ele e duas funcionárias do Judiciário foram os responsáveis indiretos pela morte de uma criança de um ano, por demora na análise de um processo de guarda.
“Como é que a OAB dá um título a uma pessoa que não está qualificada para exercer a profissão?”, afirmou o juiz Mota Junior, já com a audiência encerrada.
Veras nega ter feito as acusações ao juiz.
Em nota, a ACM (Associação Cearense de Magistrados) afirmou que a gravação é indevida por se tratar de um caso em segredo de Justiça. O magistrado alegou não poder dar entrevista devido à lei da magistratura, já que o processo está pendente de julgamento.
“Eu saí dali me sentindo humilhada e bastante constrangida. A atitude foi de diminuir meu trabalho, me diminuir. Ele me ameaçou ao dizer que estaria queimada.”
Veras, num primeiro momento, se assustou com a repercussão. Nos primeiros dias desligou o telefone ao receber diversos pedidos de entrevista, mas recebeu apoio de colegas.
Ela atua como advogada desde julho de 2017, é autônoma e tem parceria com advogados especializados em direito criminal que repassam a ela casos cíveis, como os de família.
É nessa área que pretende continuar. Passado o susto de sua história ter viralizado país afora, a advogada acredita que o fato pode não prejudicá-la na profissão. Ela continua recebendo novos casos normalmente.
A OAB fez um desagravo público a ela, no dia 22 de março, em Fortaleza. Alegando violação das prerrogativas, acionou o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a corregedoria do Tribunal de Justiça pedindo punição ao juiz —há um processo aberto.
Para ela, o fato de ser iniciante pode ter pesado no episódio. “Outros colegas mais experientes dizem que não sabem como reagiriam naquela situação. Eu temi até receber voz de prisão por desacato. O que quero agora é só seguir trabalhando, não vou desistir da advocacia.”
Após a divulgação do áudio, Mota Junior se declarou suspeito para o processo, que foi repassado a outro magistrado. O TJ-CE informou que o caso está sendo analisado pela corregedoria.
GUARDA
Em novembro do ano passado a advogada aceitou o caso de um pai que queria a guarda das filhas, de quatro e um ano. Havia a preocupação dele sobre uma possível negligência da mãe.
“Fui ao menos dez vezes ao fórum, tentar falar com o juiz sobre a urgência, e não fui recebida.” A criança mais nova morreu de engasgo com alimento em dezembro —o caso é apurado pela polícia.
Após a morte, conta, ela voltou ao fórum, pedindo urgência com relação à mais velha, mas novamente foi
ignorada. Uma outra juíza, para quem o caso foi levado com as férias de Mota Junior, acabou dando a guarda da criança ao pai.