A cidade do Líbano que torce para que Temer vire presidente
Enquanto no Brasil o vice-presidente Michel Temer (PMDB) enfrenta desconfiança de parte da população – 60% querem sua renúncia, afirma o Datafolha – na pequena cidade de Btaaboura, no norte do Líbano, “sua aprovação é de 100%”, ao menos segundo as contas do prefeito da cidade.
“Nós acompanhamos de perto pela televisão e sabemos da rejeição e acusações que ele enfrenta no Brasil. Mas estamos ao lado dele até o fim. Se Deus quiser, o próximo presidente da República do Brasil será Michel Temer”, diz à BBC Brasil o advogado Bassam Barbar, prefeito da localidade de 700 habitantes.
A explicação para tanta torcida é que o peemedebista tem raízes na pacata cidade. Sua família imigrou para o Brasil em 1924 – ele nasceria em Tietê (SP) 16 anos depois.
Temer visitou Btaaboura em 1997, quando era presidente da Câmara dos Deputados, e em 2011, já como vice de Dilma Rousseff, hoje alvo de um pedido de impeachment. Foi recebido com festa: virou nome de uma rua na entrada da cidade e ganhou uma placa.
Com a possibilidade de que assuma o Palácio do Planalto, uma praça está em construção para uma nova homenagem – cerca de US$ 100 mil (cerca de R$ 350 mil) foram gastos no projeto.
O prefeito rebate as críticas de que seria melhor aplicar a verba em melhorias para a localidade, que tem poucos recursos.
“Gastamos esse dinheiro para também nos orgulharmos de nós mesmos. Porque não temos ninguém em Btaaboura que chegou a um cargo tão grande. Essa praça em homenagem a Michel Temer é algo ainda simples para ele, mas para nós é algo grande”, diz.
Btaaboura tem como principal fonte de renda sua pequena produção de azeitonas e azeite de oliva. Nas ruas, há poucos jovens ou movimentação.
“A maioria das pessoas aqui, principalmente os jovens, estuda e trabalha em Beirute (capital do Líbano, a 75 km dali) ou até mesmo fora do país, e é natural que tenhamos este sentimento por um filho daqui, mesmo que em seu país ele enfrente rejeição ou acusações”, completa Barbar.
‘Apoio incondicional’
O prefeito conta que todos os 700 habitantes do vilarejo, encravado nas montanhas, estão a par de que um “filho” da cidade está no centro das atenções no Brasil.
Não há nenhuma pesquisa para confirmar a estimativa do prefeito, mas, mesmo os moradores ouvidos pela BBC Brasil que disseram não conhecer Temer muito bem declararam seu apoio e entusiasmo com a perspectiva de ele virar presidente.
“Não acompanho as acusações que enfrenta, nem sua vida política, mas a cidade parece não se importar”, diz o dono de empresa de construção Michel El Mir, de 45 anos, que viu o vice em uma de suas visitas à cidade.
“E por que me importaria? Não o conheço, mas o apoio, torço para que seja presidente apenas pelo fato de ele ter origem libanesa.”
O ferreiro Mikhael Bayeh, de 43 anos, disse ter visto na TV que Temer “é controverso (no Brasil)”, mas que isso não impede que os moradores apenas “vejam o lado positivo” do peemedebista.
“Aqui no Líbano, nossos próprios políticos estão envolvidos em corrupção, desvios, nepotismo. E continuam sendo apoiados em suas cidades de origem de forma incondicional”, afirma.
Imigração
O professor brasileiro Roberto Khatlab, historiador da Universidade de Kaslik, no Líbano, e autor de diversos livros sobre a imigração libanesa, diz ser uma tradição local valorizar figuras de renome internacional com origem ligada ao país.
“A cantora Shakira e a atriz Salma Hayek têm ascendência libanesa, e ambas visitaram no passado suas cidades de origem, sendo recebidas com festa e honras. O bilionário mexicano Carlos Slim, umas das pessoas mais ricas do mundo, também foi recebido com ovação em sua cidade de origem no Líbano”, conta.
Btaaboura, assim como várias outras cidades e vilarejos no Líbano, teve um passado marcado por eventos trágicos e ondas de emigração, acrescenta.
O maior fluxo de pessoas a deixar a região viajou a partir da segunda metade do século 19, principalmente por causa da “opressão, feudalismo, guerras civis, massacres, problemas de ordem econômica, demográfica, política e divergências religiosas”, explica.
“São 10 milhões de libaneses espalhados pelo mundo, e cerca de 4 milhões no Brasil. E os que se tornaram políticos, empresários e artistas de sucesso são recebidos e vistos como vencedores.”
Sem presidente
Apesar de o Líbano estar sem presidente eleito desde maio de 2014 – seus deputados não conseguem chegar a um acordo sobre um novo governante para o país – o Brasil é que está no centro das atenções, conta o prefeito.
“As pessoas aqui acompanham mais a possibilidade do Temer virar presidente do Brasil do que o processo presidencial aqui no Líbano”, diz Barbar.
“Em 2011, quando Temer esteve aqui, disse a ele que, se Deus quisesse, aquela seria a última visita dele como vice-presidente e que nós de Btaaboura o receberíamos em sua próxima visita como presidente da República”.
Hoje, o peemedebista é o principal assunto nas reuniões e churrascos na casa do prefeito, onde já se discute, por exemplo, como será a festa que eles pretendem organizar caso ele realmente assuma a Presidência.
Entre os frequentadores dos encontros está o eletricista brasileiro Elias Bahij Soueid, de 70 anos. Nascido na mesma Tietê de Temer, ele migrou para a terra de sua família aos 17 anos. Lá, casou-se com uma libanesa e teve três filhos.
“Gosto muito dele (Temer), apesar do que dizem sobre ele no Brasil. Acho que pode ajudar o Brasil se virar presidente”, diz.
Sua família é amiga da de Temer desde os tempos de Tietê. “Ele e sua família sempre iam lá em casa, ele era amigo do meu pai. Quando ele veio para cá, em 1997, me reconheceu e trocamos algumas palavras.”
Em frente à antiga casa da família de Temer, construída com as pedras de cor ocre típicas do Líbano, Soueid conta que voltou ao lugar em mais de 60 anos. Mas, para a população, o prédio é um símbolo de que habitantes de Btaaboura podem fazer sucesso no exterior, afirma.
Ao lado da casa, o engenheiro civil Nizar Temer, 65, primo do vice, lembra da viagem que fez a Brasília, em 1997, quando visitou o Congresso Nacional.
“Achei o lugar bastante bonito e grande. Meu primo era então presidente da Câmara e me levou para conhecer o local”, mostrando um retrato que tirou com o peemedebista na época.
Ele diz monitorar as notícias sobre o atual momento político brasileiro e estar confiante de que o primo chegará ao Planalto.